RESUMO |
---|
|
O testemunho de Greg Taylor
Nesta postagem você pode ler o testemunho do ex-pastor adventista Greg Taylor.
A primeira parte do testemunho é uma carta, uma carta muito amorosa, em que o Greg conta a amigos e parentes adventistas como as coisas foram acontecendo até ele se convencer de que devia deixar a Igreja Adventista do Sétimo Dia. Foi escrita em 2001, logo depois do Greg tomar a decisão. É a história de como Deus guiou alguém que sinceramente buscou a verdade.
A segunda parte é um estudo bíblico em que ele explica, etapa por etapa, como concluiu que alguns dos ensinos adventistas não têm base bíblica. [Clique aqui para ir direto para o estudo bíblico.]
Hoje Greg e Paula Taylor lideram o One Flock Ministries [Ministério Um Só Rebanho] (www.oneflockministries.org).
Agradecemos ao pastor Greg a permissão para publicar seu testemunho e jornada bíblica aqui no site. O texto original se encontra em www.oneflockministries.org/ourstory/lettertofamilyandfriends.html.
Carta aberta a nossos amigos e familiares
julho de 2001
Com frequência me fazem esta pergunta: “Como alguém pode sair da Igreja Adventista do Sétimo Dia?”. Eu mesmo já me fiz essa pergunta no passado: “Como alguém poderia se afastar dessa mensagem depois de conhecer tudo o que a igreja ensina?”. Minha opinião era que, quando alguém deixava o adventismo, a pessoa havia perdido seu rumo espiritual ou caído em algum estilo de vida pecaminoso. Mas essa tendência tem mudado nos últimos anos. As pessoas que estão deixando o adventismo estão se tornando cada vez mais dedicadas a Cristo. Para muitos na igreja, isso não faz sentido porque acreditam que o adventismo é “a verdade”. Como alguém pode deixar “a verdade” e ainda seguir a Jesus? Uma maneira mais estranha de pensar é a ideia de que alguém poderia realmente ser conduzido para fora do adventismo como parte de seu processo de crescimento espiritual. Essa é a questão que desejo tratar aqui. Espero que você ouça minha história e, com oração, examine o que tenho a dizer. Confira aquilo que falo com as Escrituras para ver se é isso mesmo.
Eu nasci adventista e fui criado como adventista. Estudei em escolas adventistas desde o ensino básico até o mestrado na faculdade. Apesar de ter me afastado no período entre minha adolescência e até vinte e poucos anos, meu nome nunca foi removido dos livros da Igreja Adventista do Sétimo Dia (IASD). Fui batizado com doze anos, mesmo achando que não conhecia Jesus. Fui educado em um lar legalista que seguia bem de perto os ensinos de Ellen Gould White (EGW). Eu sabia muito sobre a lei, mas quase nada sobre a graça. Eu era um daqueles garotos que queria fazer o que era certo, mas parecia que simplesmente não era capaz disso. Assim, com o passar do tempo, minha incapacidade de viver à altura de todas as regras fez com que me desanimasse. Quando terminei o ensino secundário numa escola adventista (na verdade fui expulso dali), desisti de Deus e da igreja. Eu fugia de qualquer coisa que lembrasse Deus. Essa escolha quase destruiu minha vida, e o resultado foi me entregar às drogas e ao álcool. Durante quase quatro anos eu sofri por causa dessa vida de vícios, sem esperança e acabando com minha saúde. Minha vida estava desmoronando totalmente. Certa noite, quando eu estava bem drogado, decidi experimentar Jesus e desde então nunca mais fui o mesmo. O Senhor se curvou até onde eu estava e tocou nesse meu coração duro apesar de minha condição desesperadora e soprou nova vida em mim. Eu me tornei um filho de Deus nascido de novo. Eu sempre louvarei o nome de Jesus por seu inesgotável amor por mim!
Assim que me tornei cristão, fui para um centro de recuperação cristão chamado Bridge Fellowship, no estado do Kentucky. Ali comecei a ler a palavra de Deus e a crescer como cristão e também a me desintoxicar. Depois de sete meses ali, com a ajuda de meus pais abriram-se as portas para eu ir estudar na Southern Adventist University [Universidade Adventista do Sul]. Fui para lá como um cristão desconfiado da denominação, mas ansioso em aprender sobre Deus. Interessado no treinamento para poder compartilhar as boas novas com outros, eu me envolvi com oportunidades de ministério estudantil ali no câmpus e descobri muitos amigos cristãos. Foi naquela universidade que me tornei adventista por convicção. Estudei pedagogia porque tinha enorme desejo de vir a ensinar no ensino médio de alguma escola adventista e de ajudar outros garotos a aprender mais sobre Jesus, ao invés de apenas regras legalistas da igreja. Mas, quando eu estava no último ano da faculdade, os líderes da conferência local me procuraram para perguntar se eu estava disposto a pensar em me tornar pastor. A essa altura eu estava pronto para pensar em servir como pastor, algo para o qual eu tinha sentido Deus me dirigir desde a infância, mas eu tinha resistido durante a maior parte de meu tempo na faculdade. Aceitei o chamado e servi como estagiário por um ano em uma das igrejas locais dali.
Nessa época, uma crise teológica assolou a igreja. Desmond Ford foi removido de seu cargo de professor no Pacific Union College [Faculdade Adventista da União Pacífico] por suas ideias sobre o Juízo Investigativo. Walter Rea foi removido de seu pastorado porque trouxe à tona o extenso trabalho de copiagem que havia sido feito por E. G. White em muitos de seus livros. Chamar de devastador o impacto sobre a comunidade adventista seria pouco. O pastor principal da minha igreja local acabou abandonando, bem desanimado, a estrutura adventista do sétimo dia. Eu fui para o seminário duvidando que era um adventista. Uma coisa estava clara: com base em minhas pesquisas nos documentos manuscritos eu sabia que E. G. White havia, sim, copiado extensamente de outros autores e que frequentemente acrescentava a expressão “foi me mostrado” às frases copiadas. Eu também sabia que a doutrina do Juízo Investigativo tinha problemas sérios. Então fui para o Andrews Theological Seminary [Seminário Teológico Andrews, ligado à Universidade Andrews], localizado em Berrien Springs, sabendo que eu estava em uma posição insegura no que diz respeito à igreja. Apanhei minha esposa, com quem havia me casado um ano e meio antes, e fomos para Berrien Springs.
Diversas coisas me aconteceram na Andrews University [Universidade Andrews] que me mantiveram no ministério da IASD. Primeiramente, diversos professores foram graciosos comigo. Ivan Blazen foi um enviado de Deus. Eu floresci sob seu ensino. Também tive a bênção de ter Raoul Dederen e Hans LaRondelle como professores. Esses homens me ajudaram a ver que o perfeccionismo daqueles que se opuseram a Ford não era a posição de todos os professores. Em seguida, pude estudar o Juízo Investigativo e obtive algumas explicações plausíveis que, naquele momento, aquietaram minhas preocupações. Agora sei que aquelas soluções eram terrivelmente inadequadas, mas foram úteis naquele momento. Além disso, alguns especialistas do White Estate [Patrimônio White] vieram até a faculdade para apresentar um parecer de advogados que inocentavam E. G. White de ter cometido crime de plágio. Embora hoje eu saiba que aquele parecer se baseou em brechas existentes nas leis da época em que E. G. White viveu e não porque não fosse ilegal ou errado, isso aquietou a minha mente.
O último e mais importante fator foi que minha primeira esposa, depois de pouco mais de dois anos de casamento, decidiu que não estava mais interessada em estar casada. Quando ela me deixou, logo antes da metade do segundo quadrimestre letivo, minha principal preocupação nos 18 meses seguintes passou a ser sobreviver. Deixei de lado as intricadas questões teológicas para me concentrar em superar minha dor pessoal. A fim de sobreviver, tive de deixar em segundo plano minhas dificuldades com a igreja. Por muitos anos não tratei diretamente das dificuldades teológicas. Mas minha confiança em E. G. White nunca foi a mesma depois disso. Eu sabia que havia vários e sérios problemas com sua autoridade. Eu ainda lia The desire of ages [O desejado de todas as nações ] e Steps to Christ [Caminho a Cristo], mas eu sabia que usar E. G. White como comentário bíblico no mesmo nível das Escrituras era ignorar os problemas da credibilidade dela.
Enquanto estava na Andrews, conheci uma linda estudante de comunicações chamada Paula Wesner. Conversávamos bastante e tínhamos contato em atividades de ministério no câmpus. Apesar de nunca nem mesmo termos saído juntos até depois de eu me formar no seminário, nós desenvolvemos uma grande amizade. Quando saí da Andrews, começamos um relacionamento a longa distância, o qual resultou em nos casarmos em março de 1985.
Paula e eu nos lançamos no ministério. No início, nosso trabalho pastoral foi com igrejas de dois distritos. Fazíamos reuniões evangelísticas, etc. Eu fui ficando cada vez mais incomodado com os métodos evangelísticos tradicionais, que se concentravam nos acontecimentos dos dias finais e na interpretação profética. Eu sentia que meu chamado era alcançar pessoas com o evangelho de Jesus Cristo, conduzi-las até ele como seu Salvador e ajudá-las a aprender a viver um relacionamento com ele. O que eu mais via na abordagem tradicional tinha o objetivo de alcançar pessoas que já estavam em alguma igreja. As reuniões tinham apenas uma ou duas noites dedicadas ao evangelho, e o resto do tempo era dedicado a apresentar nossas doutrinas. Eu percebia que boa parte da metodologia de ocultar o nosso nome e usar um espaço neutro tinha o propósito de ludibriar. Boa parte do conteúdo dos seminários e palestras se baseava em textos de prova que eu sabia que eram suspeitos. Aqueles textos não eram respaldados pelo contexto. Comecei a me sentir frustrado com o pastorado distrital e, quando surgiu a oportunidade de ser pastor de jovens de tempo integral, não perdi a chance. Nós fomos para Kettering, estado de Ohio, e servimos aos jovens daquela igreja por seis anos e meio.
Paula é, por natureza, uma pessoa hospitaleira, e eu amo compartilhar o básico do cristianismo. Era uma combinação perfeita. Nós nos afastamos das dificuldades teológicas e mergulhamos no importante ministério de conduzir aqueles jovens a Jesus. A maioria deles tinha, como eu, crescido na igreja, mas não conhecia Jesus. Paula proporcionava um ambiente hospitaleiro e aconchegante, onde isso podia acontecer. Nós vimos muitos garotos chegarem a Cristo e alguns entrarem no ministério de tempo integral.
Durante esse tempo, entretanto, precisei aprender sobre equilíbrio. O ministério com jovens consome muitíssimo tempo. Planejar durante toda a semana e dirigir as atividades durante todo o final de semana (que, com frequência, avançavam nas primeiras horas da manhã) cobraram seu preço. Quase tive uma estafa e, então, pedi demissão de meu ministério. Graças a Deus e a alguns bons amigos, recuperei a saúde e fiz outra descoberta em minha vida espiritual. Eu experimentei um aprofundamento na minha caminhada com o Senhor, que era como uma conversão em um nível bem mais profundo. Paula também estava crescendo. Não apenas espiritualmente! Ela estava grávida de nosso primeiro filho, Jordan. Logo Matthew também chegou. Esses dois presentes do Senhor nos ajudaram a compreender o amor de Deus por nós, de uma maneira nova e mais profunda. A graça de Deus é maravilhosa!
Junto com os filhos veio a percepção de que nós não poderíamos prosseguir com o ministério com jovens e nos manter equilibrados. Agora tínhamos nossos próprios filhos a quem ministrar. Tínhamos também um profundo senso de que Deus nos chamava a algo especial. Um dia veio o chamado para irmos para Asheville, estado da Carolina do Norte.
Havia uma igreja que estava tentando adotar métodos mais contemporâneos para alcançar outras pessoas. Estavam usando princípios do ministério com jovens para alcançar adultos para Jesus. Eles estavam experimentando métodos usados pela Willow Creek Community Church [Igreja Comunitária de Willow Creek], na cidade de Chicago. Nós oramos muito para tomar uma decisão, pois tínhamos plena consciência dos perigos de tentar mudar uma igreja para um modelo mais contemporâneo. Muitos haviam tentado, e bem poucos haviam conseguido. Por isso, oramos intensamente pedindo a orientação de Deus. Depois de muitas e claras indicações da providencia divina, nós nos mudamos para a Carolina do Norte. Esse foi o início de um período intenso mas recompensador de ministério. Um crescimento pessoal e espiritual tremendo ocorreu em nós. Deus abençoou nossa igreja também. Apesar do fato de que umas 50 pessoas deixaram a igreja durante a transição do modelo tradicional para um contemporâneo, nós crescemos de uma frequência média de 120 pessoas antes da transição para uma vibrante congregação de 500 membros. Vimos de fato a mão do Senhor na renovação da igreja de Foster. Meu dom de evangelização podia ser usado de uma tal maneira que não me forçava a usar os métodos tradicionais. Paula pôde usar seus dons de hospitalidade e comunicação criativa, e nossos meninos puderam ter muitos amigos e uma grande comunidade.
Durante essa época visitamos a Igreja de Willow Creek para participar de vários treinamentos. Ficamos profundamente tocados pela ligação com outros cristãos que amam Jesus e dão tudo de si para alcançar o mundo para ele. Para nós os momentos de culto eram para nós como um gostinho do céu. Eu lembro de conversarmos sobre como esse movimento de Deus era muito mais vibrante do que qualquer coisa que nós já tínhamos experimentado no adventismo. Eu lembro de pensar e de conversar com a Paula que o povo remanescente de Deus serão pessoas que sentirão uma profunda paixão por alcançar os perdidos e terão imenso prazer em adorar. Essa é a mensagem do primeiro anjo de Apocalipse 14.6-7. Nós tínhamos um desejo profundo de ver essas coisas acontecerem em nossa própria igreja local. Muito daquilo que aprendemos em Willow Creek tentamos compartilhar em nossa igreja. Pouco a pouco Deus nos conduziu como igreja a um estilo mais aberto e mais expressivo de culto e a um compromisso mais profundo de alcançar pessoas perdidas.
Por muito tempo tive dificuldade com a ideia de que os adventistas eram a única e exclusiva igreja remanescente. Eu sentia que a ideia era muito restrita e acreditava que o conceito de uma mensagem remanescente era, ao invés do “de uma igreja remanescente”, uma interpretação mais realista de Apocalipse 12. O problema da falta de renovação espiritual na maioria das igrejas adventistas do sétimo dia e da presença da vida abundante fora de nossa igreja continuava me incomodando. Depois de cerca de cinco anos em Foster, nós começamos a estabilizar em nosso crescimento. Ainda éramos uma igreja vibrante, mas parecia que não estávamos alcançando de verdade nosso grupo-alvo — as pessoas sem igreja. Embora estivéssemos, sim, alcançando algumas pessoas sem igreja, a maioria daqueles que estávamos alcançando tinha algum antecedente adventista. Não que esse não seja um grupo importante a alcançar, mas eram quase todos os que estávamos alcançando. Eu orava e orava sobre isso. Meu dom de evangelização ardia dentro de mim, mas parecia que algo bloqueava minha eficácia. Comecei a achar que devia haver algo errado comigo. Passei muito tempo me questionando. Será que esse desejo de ter uma igreja grande é apenas uma coisa do ego ou será que é a compaixão pelos perdidos que me está impulsionando? Procurei aconselhamento cristão, o que me foi muito útil para resolver algumas questões do meu passado e das quais eu não tinha consciência e também as questões que eu estava enfrentando quanto a fracasso/sucesso. Pude ver as partes de mim que precisavam de cura e as confessei ao Senhor e recebi o seu perdão.
Nesse ínterim a igreja permaneceu estagnada. Descobri que eu não estava tão interessado no tamanho da igreja quanto estava em usar os dons evangelísticos que Deus havia me chamado a usar. Esse foi um momento de profundo autoexame. Eu sabia que algo estava bloqueando o plano de Deus de usar esse dom em minha vida, mas eu não sabia o que era. Consideramos alguns convites, mas não sentimos que o Senhor estava nos dirigindo a deixar a igreja naquele momento. Eu ia a retiros espirituais e jejuava e orava pedindo orientação a Deus. Com base em Lucas 11.1-13, eu clamava pela presença do Espírito Santo e pela clara orientação de Deus.
Nessa época um amigo que realizava um ministério parecido chamou Carl George, um especialista em evangelização e crescimento da igreja, para estudar sua igreja. O crescimento da igreja desse amigo também havia estagnado. A avaliação de Carl George foi que a igreja não conseguia penetrar na comunidade de pessoas sem igreja por causa de questões relacionadas ao sábado. Essa era uma barreira grande demais para a maioria daqueles que não foram criados no adventismo ou não se casaram com algum adventista. Para pastores que são chamados a alcançar pessoas para Jesus, isso parecia problemático. Temos de alcançar o mundo, mas estamos encontrando uma barreira que faz parte da própria estrutura do adventismo. Nessa época eu simplesmente aceitei que, se Deus quisesse nos usar para alcançar pessoas de fora da estrutura, ele daria um jeito.
Enquanto isso, dois amigos em ministérios parecidos deixaram o adventismo para começar igrejas não denominacionais. O que, inicialmente, os levou a se separarem da IASD foram questões financeiras entre eles e as conferências das quais faziam parte. Eles estavam tendo dificuldade em sustentar o ministério todo da igreja e, ao mesmo tempo, enviar 100% do dízimo para a conferência. Essa é uma questão que todo pastor adventista enfrenta, de modo que me solidarizei com a situação deles. Mas, logo depois disso, eles mudaram o culto do sábado para o domingo. Tenho de admitir que nesse momento fiquei irado com eles. Não foi exatamente raiva, mas senti que haviam causado uma mancha no já abalado movimento de evangelização contemporânea dentro da igreja. Eu havia ficado bem menos apreensivo quando deixaram a igreja por questões relativas ao dízimo, pois a estrutura da IASD sufoca duramente a igreja local, tirando seus recursos. Os pastores adventistas, desde os mais conservadores até os mais progressistas, enfrentam problemas com isso. Eu tinha esperança que eles demonstrariam que igrejas poderiam ser bem sucedidas sem terem, financeiramente, de fazer parte da estrutura. Mas a questão do sábado os desacreditou comigo e com a maior parte da comunidade da IASD. Falei para eles como eu me sentia. Os dois foram graciosos em ouvir minhas preocupações, compartilharam algumas de suas ideias e foram polidamente cristãos comigo.
Quando esses amigos pastores abandonaram o adventismo e, mais tarde, o sábado, passei um tempo estudando. O motivo principal de eu ser adventista era o sábado. Até aquele momento eu havia acreditado que, das igrejas que eu já havia encontrado, o adventismo era a igreja que mais se aproximava do ensino da verdade bíblica. Por esse motivo, eu era um firme adventista por convicção, apesar de minhas preocupações com Ellen White, o Juízo Investigativo e o ensino sobre a igreja remanescente. Eu estava convicto de que o sábado era o dia especial de Deus. Meus sermões durante esse período eram bem diretos sobre esse assunto. Eu também ensinei aos novos crentes que, embora a IASD não fosse uma igreja perfeita, eu entendia que era a mais próxima da verdade bíblica, conforme eu a entendia. Por esse motivo, eu não tinha nenhuma dificuldade em chamar pessoas a assumirem o compromisso de fazer parte da igreja adventista. Muitas vezes eu prosseguia minha fala e dizia que, se eu descobrisse uma verdade maior na Bíblia, eu a seguiria.
Estudei os textos que meus amigos, que haviam abandonado a denominação, recomendaram. Também examinei materiais escritos por teólogos adventistas, inclusive Samuele Bacchiocchi, a maior autoridade da igreja sobre o sábado. Além disso, consultei dois dos mais respeitados professores e escritores da nossa denominação, com a enorme vontade de provar onde meus amigos estavam errados. Li, estudei e me convenci de que os adventistas têm a verdade sobre o sábado. Também cri que E. G. White tinha o dom espiritual de profecia, embora ela não fosse confiável como intérprete das Escrituras. Para mim os adventistas tinham, ainda que não exclusivamente, uma mensagem remanescente, e, com um pouco de criatividade e uso de textos de prova, era possível harmonizar o Juízo Investigativo de 1844 com a posição de EGW. Mas para mim a essência era o sábado. Livre-se do sábado, e você já não tem nenhuma igreja adventista. Afinal, o sábado faz parte do nome!
Por volta dessa época, estávamos — eu, minha esposa e os filhos — nos preparando para iniciar nosso período sabático. Tínhamos planejado viajar pelos Estados Unidos, ir a parques nacionais e, nos finais de semana, visitar igrejas. Foi exatamente o que fizemos. Tivemos uma viagem maravilhosa. Durante toda a viagem pedimos ao Senhor que nos mostrasse o que ele queria fazer com nossas vidas. Queríamos estar abertos à sua liderança e segui-lo, qualquer que fosse o custo. Ter um verão inteiro para estudar, orar, escutar e observar pareceu uma grande maneira de ouvir a voz de Deus. E foi um verão maravilhoso. Eu orava e ouvia cada dia. Em cada ocasião eu percebia o Senhor me dizendo para simplesmente esperar. Deus me deixou saber, por meio de profunda oração e estudo, que aquilo que ele queria que eu aprendesse com a experiência daquele período sabático me impactaria de uma vez só e seria bíblico e cristalino.
Durante o verão nós fomos surpreendidos com a falta de vitalidade espiritual em todas as igrejas adventistas que visitamos. Embora as pessoas fossem sinceras, havia tamanha falta de vida que era deprimente. Era quase como se aquelas pessoas estivessem apenas “indo na onda” da igreja. As igrejas de domingo eram outra coisa. Com exceção de uma igreja que visitamos, todas tinham tamanha vida e alegria que isso era contagiante. Nós nos alegrávamos quando estávamos nessas igrejas de diferentes denominações ou em comunidades independentes. Quando visitávamos as igrejas adventistas do sétimo dia, ficávamos tristes e deprimidos. Lembro de orar: “Por que, Senhor? Se o sábado é tão importante e faz parte de sua lei moral, que é obrigatória a todos os cristãos, por que o Senhor está claramente abençoando outras igrejas, enquanto as igrejas adventistas estão, no máximo, se mantendo?” Voltamos de nosso período sabático energizados por um lado e entristecidos por outro. Estávamos tão contentes por estar de volta à nossa igreja, onde havia alguma vibração. Antes de voltar a trabalhar, passei três dias em um retiro espiritual pessoal solitário, estudando e orando pela orientação de Deus para a temporada seguinte de ministério. Escrevi meus pensamentos, estudei, orei e refleti. Ainda a mesma resposta: “Você descobrirá o que eu tenho para você aprender, e será logo. Tenho um plano para sua vida e o revelarei por meio da minha palavra”.
Nada poderia ter-me preparado para o que aconteceu em seguida. Recebi uma ligação de um colega pastor adventista e amigo de longa data que, na minha experiência, eu sabia que amava Jesus como poucos outros. Tenho grande respeito por sua caminhada com o Senhor e por seu compromisso em segui-lo a qualquer custo. Ele se abriu comigo e compartilhou que vinha estudando o sábado e não estava seguro se nossa posição adventista do sétimo dia estava baseada biblicamente no Novo Testamento. Isso foi um baque, para dizer o mínimo, mas ele mencionou os mesmas questões que eu vinha enfrentando quanto a igrejas não sabatistas terem uma unção tão óbvia do Espírito de Deus, enquanto as nossas igrejas se debatiam. Compartilhei minhas dificuldades sobre esse assunto. Para encurtar a história, vários outros amigos que eu sabia que eram totalmente comprometidos com Jesus estavam, naquele mesmo período, enfrentando a mesma questão. No meu caso isso deu início a um período de intenso estudo. Voltei aos materiais que eu havia estudado para refutar meus colegas ex-adventistas e dessa vez decidi estudar com a Bíblia aberta e uma mente aberta. Talvez Deus estivesse tentando me dizer algo. O que eu aprendi com o estudo da palavra de Deus literalmente bagunçou o meu mundo. Ao mesmo tempo, esse foi o estudo mais libertador e mais gratificante que já realizei. Fiel à sua promessa, Deus transformou radicalmente minha maneira de pensar. Paula também foi profundamente abençoada por esse estudo. Nós chegamos a entender a Bíblia de uma maneira inteiramente nova e poderosa.
Fiquei surpreso em descobrir que o Novo Testamento não ensina o sábado da maneira que eu pensava que ensinava. Eu aprendi em Colossenses 2.16-17, Gálatas 4.10, Romanos 14.5-6 e Hebreus 3—4 que o sábado era uma instituição que apontava adiante para e, por esse motivo, não era mais obrigatório para os cristãos. O Novo Testamento aponta para uma pessoa (Jesus) como o verdadeiro sábado, não para um dia. Descobri que a lei, em Cristo, foi reinterpretada para todos os crentes. O Novo Testamento deixa bem claro quais partes da lei tem continuidade em Cristo e quais não têm. Por fim, descobri que o dia de adoração não é o teste final de lealdade a Deus; pelo contrário, o teste é uma entrega total a Jesus Cristo, selada pela habitação do Espírito Santo. Sei que esse entendimento precisa ser mais elaborado, por isso incluí no apêndice um breve levantamento de meu processo de descoberta. Recomendo muito que você gaste o tempo necessário para ler e estudar esse material e verificar se as coisas são assim mesmo.
Lembro quando, alguns anos atrás, houve uma onda de procurar “imagem oculta”. Eram pinturas que apareciam em escritórios, livrarias, salões, etc. Com frequência dava para ver multidões ao redor dessas pinturas, que à primeira vista pareciam ser nada mais do que um grupo das cores atiradas ao acaso. Nada mais do que isso. Mas, enquanto as pessoas se concentravam nessas obras de arte, uma após a outra exclamava em alta voz: “Estou vendo! Estou vendo!” Então elas imediatamente ensinavam os outros sobre a maneira correta de olhar a pintura, para que eles também pudessem ver a imagem. Eu também dei a minha parte e fiquei olhando fixamente nesses quadros. Eu queria ver o que era tão empolgante assim naquelas pinturas, que, no demais, não passavam de pinturas de aparência estranha. Mas não fui um dos sortudos. Eu não via nada.
Então um dia parede, tendo algum tempo para gastar, sentei em frente a uma dessas pinturas penduradas na parede e fiquei olhando fixamente. Devo ter ficado ali sentado uns 15 a 20 minutos apenas olhando fixamente. Estava quase desistindo e chamando tudo aquilo de farsa, quando, de repente, eu vi! Uma linda representação tridimensional da Estátua da Liberdade pareceu saltar do quadro. Era realmente surpreendente! Eu mal conseguia acreditar.
Logo eu estava folheando um livro com pinturas parecidas, procurando seus segredos escondidos. Que descoberta! Desde que eu fiz a descoberta inicial, todas as pinturas pareciam ganhar vida. Nunca mais eu consegui olhar da mesma maneira para uma essas pinturas com imagem oculta.
De modo bastante parecido, as Escrituras ganharam vida à medida que fui estudando. Inicialmente eu via o que sempre tinha visto. Mas então, certo dia, elas ganharam vida para mim. Comecei a ver a Bíblia como nunca havia visto antes. Depois de ver a verdade ganhar vida dessa maneira, não consegui voltar a ver a Bíblia da mesma maneira. Não quero, de forma alguma, fazer pouco caso do entendimento que qualquer um que seja tenha da Escritura. Nem quero dizer que estou certo e que os outros estão errados. Tudo que posso dizer é que vi uma cena de Deus e sua Palavra que despedaçou todos os meus paradigmas anteriores. Sou grato por esse dom da graça de Deus.
Deixe-me dizer mais uma coisa. Por causa de minha posição como pastor adventista, o estudo sobre o sábado trazia grande risco pessoal. Tudo que eu já tinha conhecido como cristão e como ministro podia estar em jogo. Minha esposa também tem profundas ligações na igreja. Temos amigos de longa data pelos quais temos muito apreço. Temos uma igreja que amamos muito e que nos ama. Nós não temos, fora o ministério, nenhuma outra habilidade profissional valorizada no mercado de trabalho. Paula pôs sua carreira de escritora de lado para poder ficar em casa com os filhos. Nós não temos nenhuma outra ocupação para recorrer numa emergência. Foi assim, com receio e hesitação, que nós começamos a estudar, sem saber qual poderia ser o resultado, mas desejando do fundo do coração seguir ao Senhor, mesmo que isso significasse perder tudo. Afinal, durante anos tínhamos incentivado as pessoas a seguir a Deus qualquer que fosse o custo e a confiar nele quanto aos resultados. Que tipo de líderes espirituais poderíamos ser, caso recusássemos arriscar tudo pela causa de Cristo.
Alguns de vocês talvez estejam perguntando: “E quanto a E. G.White? Como ela se encaixa nisso tudo?”
Paula e eu havíamos passado a ser pessoas comprometidas “com a Bíblia e só com a Bíblia”. Isso não significa que não consideramos haver devido espaço para dons espirituais, mas, porque devemos testar os dons por meio da Palavra, e não o contrário, temos de ir à Palavra.
Temos de mencionar o fato de que, na questão de EGW, existem problemas sérios que infelizmente a igreja não tem estado disposta a tratar abertamente. Para sermos justos, sugerimos que cada adventista faça pessoalmente alguma pesquisa e decida qual lugar desejam dar a EGW em sua teologia pessoal. Sugiro entrar na internet e pesquisar Ellen White. Você encontrará sites a favor de EGW e outros que são críticos de seu ministério. Você deve ler ambos e decidir por você mesmo. Lembre-se de 1Tessalonissenses 5.20-22.
Com base em nossa pesquisa chegamos à conclusão de que ela não é uma voz profética confiável. Isso não significa que algumas vezes não tenha escrito coisas inspirativas. Nós dois gostamos muito dos livros Caminho a Cristo e O desejado de todas as nações. Mas EGW copiou clara, consciente e amplamente outros autores, ao mesmo tempo em que, exceto em poucos e raros casos, afirmava que não estava fazendo isso. Algumas estimativas de seus empréstimos chegam a aproximadamente 80%. De acordo com um estudo patrocinado pela IASD, até mesmo O desejado de todas as nações, meu livro favorito de EGW, “não tem nenhuma linha de pensamento que é original” de EGW. Mesmo nos livros em que ela diz “foi me mostrado”, há evidências de ampla copiagem. Em seus textos ela copiou materiais de outros e em muitos casos copiou os erros junto com o que era verdade.
Alguns têm dito que as leis eram diferentes naquela época. Essas pessoas dizem que ela não poderia ter sido condenada pela justiça de sua época. Talvez não pudesse, mas Ellen e o marido, James, eram inflexíveis que outros não deviam copiá-los sem dar o devido crédito! Até mesmo censuraram duramente outros por terem feito isso, destacando a desonestidade dessa prática. O sentimento da sociedade quanto à pirataria literária era exatamente o mesmo. Tenho comigo uma cópia do Healdsburg Newspaper [Jornal de Healdsburg], datada de 20 de março de 1889, em que a comunidade local ficou indignada com algum plágio descoberto nos escritos de EGW. Isso era claramente desonesto, e ela sabia disso. As pessoas que viviam por perto não aprovaram isso. Foi essa descoberta que a obrigou a admitir ter usado fontes externas no livro The great controversy [O grande conflito]. Assim mesmo, ela admitiu apenas aquilo que ela sabia que os outros sabiam que ela havia sido copiado.
Há também o encobrimento daquelas visões de EGW que ensinam o oposto daquilo em que mais tarde ela acreditou. O prefácio de Early writings [Primeiros escritos], afirma nas páginas iii e iv que não houve nenhuma supressão. Os editores afirmam incluir todas as primeiras obras dela. Afirmam que apenas uma ou outra palavra foi substituída para tornar mais claro o sentido original. Tudo isso foi feito “com a aprovação da autora”. A verdade é que trechos importantes de suas primeiras visões foram deixados de fora e que o sentido original foi alterado. Tenho visto comparações entre os documentos mais antigos de EGW e o livro Primeiros escritos. As supressões foram claramente intencionais e enganadoras. EGW sabia muito bem o que estava acontecendo. Esses escritos suprimidos foram encobertos pela igreja e pela própria EGW. Isso foi considerado por seu colega de trabalho W. W. Prescott e por outros como algo desonesto e ludibriante.
Para nós, o maior problema com Ellen White é o efeito que ela tem causado na IASD. O evangelho da graça ainda é amplamente mal entendido no adventismo. Em nossos anos de trabalho ali, essa foi uma enorme barreira para ajudar pessoas a encontrar segurança. Não que ela não tenha ensinado a graça. Às vezes ensinou de uma linda maneira, mas também ensinou perfeccionismo. Como denominação os adventistas ainda estão basicamente confusos sobre o cerne da fé cristã. É muito difícil para a maioria dos adventistas compreender o evangelho por causa dessas afirmações. Nunca vimos uma igreja adventista verdadeiramente dedicada a aplicar os escritos de EGW que seja, ao mesmo tempo, uma comunidade vibrante, viva, crescente e alegre. A responsabilidade disso recai diretamente sobre os ombros de EGW. Certamente uma igreja com 100.000 páginas de escritos “inspirados” deveria ter uma compreensão até maior das Boas Novas do que outras igrejas. Lamentavelmente esse não é o caso. Jesus nos ensina a testar os profetas pelos seus frutos. O que fazemos com os problemas que acabamos de mencionar? Gálatas 1.8 diz que, mesmo que um “anjo de luz” venha e ensine um evangelho diferente, que ele seja amaldiçoado. Ellen White não ensinou uma teologia de “fé que trabalha”, mas uma teologia de “fé mais obras”, mesmo em algumas de suas últimas obras, tais como O grande conflito. Leia o capítulo sobre o Juízo Investigativo e verifique o que você acha. Considerando apenas essas questões, já somos forçados a dizer que, no mínimo, EGW não é confiável como profeta. Com certeza não podemos dizer que devemos considerar as opiniões dela um complemento da Bíblia.
Cremos que existem alguns motivos pelos quais é difícil deixar a verdade toda sobre EGW vir à tona. Um motivo importante talvez seja um interesse direto em manter a ideia de que EGW foi uma profeta verdadeira no mesmo nível dos profetas da Bíblia. Isso faz parte da identidade da “igreja remanescente”. Nos idos de 1919 a decisão da Conferência Bíblica organizada por nossa Associação Geral foi que houvesse uma divulgação imediata dos problemas com EGW como voz profética na igreja. Eles passaram a tentar ajudar as pessoas a entender a verdade sobre o dom dela. Mas houve uma reação tão grande contra aqueles que estavam tentando contar a verdade, que alguns importantes professores de Bíblia foram despedidos. Infelizmente a denominação se afastou da divulgação da verdade toda sobre EGW. Prevaleceu uma atmosfera de medo de tratar desses assuntos. Hoje temos de enfrentar essa realidade depois de muitos outros anos de conceitos arraigados e equivocados.
A afirmação de Apocalipse 12.17 de que o remanescente guardará os mandamentos de Deus faz parte da identidade desse remanescente na igreja. (De acordo com os adventistas, esses mandamentos são os Dez Mandamentos, mas isso não é respaldado pela gramática, conforme examinado abaixo na seção de estudo bíblico.) A segunda parte da passagem afirma que esse “remanescente” terá o testemunho de Jesus. A interpretação adventista destaca, então, que Apocalipse 19.10 diz que o testemunho de Jesus é o Espírito de Profecia. A conclusão é: “a igreja verdadeira” dos últimos dias ensinará todos os mandamentos de Deus, inclusive o quarto, e terá alguém como profeta. Muitos adventistas chamam carinhosamente os escritos de EGW de o “Espírito de Profecia”.
O problema com essa interpretação é que ela não faz justiça à gramática e ao contexto de Apocalipse. Em Apocalipse 19.10, o “Espírito de Profecia” é uma clara referência ao Espírito Santo. É outro nome que designa o Espírito Santo, que inspira os profetas. Esse mesmo Espírito está por trás de toda a proclamação do evangelho. Traduzir que o testemunho de Jesus sempre se refere à voz profética seria ignorar o que o restante de Apocalipse diz sobre o testemunho de Jesus. Por exemplo, Apocalipse 1.2 diz que João “atestou a palavra de Deus e o testemunho de Jesus Cristo e todas as coisas que viu”. Será que o versículo está se referindo a EGW? As ideias com certeza não se encaixam. Com base no contexto, parece que essa é uma referência à mensagem do evangelho. Agora observe o versículo 9. Aí João diz que estava na ilha de Patmos “por causa da palavra de Deus e do testemunho de Jesus Cristo”. Será que é uma referência a EGW? Não. Não é nem mesmo uma referência à profecia em geral. João ainda não tinha recebido qualquer visão profética. Essa é uma clara referência ao evangelho, o testemunho sobre Jesus. Ficou claro para mim que encaixar EGW em Apocalipse 12.17 também era forçar demais a interpretação. Não quero ser culpado de projetar no texto minha própria interpretação escatológica, ao invés de deixar o texto falar por si mesmo. Isso é incrivelmente perigoso à luz das advertências encontradas em Apocalipse 22.18-19 sobre acrescentar ou tirar palavras do livro.
Nosso principal motivo para nos tornar adventistas anos atrás foi nosso profundo desejo de servir ao Senhor. Paula e eu nos unimos a essa igreja (eu por rebatismo, durante minha época na faculdade), tornando-nos adventistas porque acreditávamos que a IASD era a denominação que seguia mais de perto a palavra de Deus. Vimos no adventismo um grupo de pessoas que não tinha medo de seguir suas convicções mesmo que não fossem ideias populares a serem aceitas em nossa cultura. Nós nos tornamos parte da igreja basicamente porque acreditávamos que a observância do sábado era exigida e honrava a Deus. Também fomos atraídos pelo estilo de vida saudável. Críamos que o adventismo tinha muito a oferecer ao mundo. Ainda cremos em muita coisa que a igreja ensina.
Embora Paula e eu não acreditemos na ideia adventista de que o sábado é moralmente obrigatório, de que seja bíblico, cremos, sim, que o dia semanal de descanso é uma maneira saudável de viver e tem mérito para o crescimento espiritual. Valorizamos e apoiamos o conceito de dia semanal de descanso. Desfrutamos os benefícios espirituais de ter um dia que é dedicado a Deus e à família. Nós gostamos demais de fazer um meio jejum e deixar o ruído e a agitação cessarem. Essa é uma parte de nossas vidas espirituais que consideramos importante e que sempre apreciaremos. Mas insistir que tem de ser sempre no sábado ou que isso é ordenado pelas Escrituras é acrescentar à palavra de Deus uma exigência desnecessária para os novos crentes. Isso constitui uma desnecessária pedra de tropeço. Isso atrapalha muitos que vêm a Jesus. Cremos que devemos remover todos os obstáculos que estejam no caminho daquele que procura de verdade, exceto o escândalo da cruz. Esse é o âmago da mensagem de Gálatas e do restante do Novo Testamento.
Paula e eu temos um profundo amor e preocupação pela igreja adventista. Nós não fomos magoados nem maltratados. Não temos inimizade com ninguém na igreja. A denominação foi muito boa conosco. Ao contrário da experiência de alguns, nós não temos nenhuma história horrível de termos sido maltratados pela liderança. Nós somos gratos ao adventismo e àquilo que ele significou para nossa família e nosso crescimento no Senhor. Praticamente todo nosso processo de amadurecimento como cristãos ocorreu dentro da igreja adventista. Fomos profundamente abençoados por nossa ligação com a igreja. Mas Deus está nos chamando a continuar indo em frente. Creio que essa seja sua intenção também para a igreja adventista. Houve verdadeiramente mérito naquilo que os pioneiros adventistas acreditavam. Eles eram inflexíveis em não se tornar em mais uma denominação, mas insistiam em chamar a si mesmos de movimento. Com isso estavam indicando que, se descobrissem mais verdades, eles as seguiriam e deixariam os erros para trás. A igreja adventista tem muito a oferecer. Se ela continuasse indo em frente, creio que poderia causar impacto tremendo no mundo, como parte da grande igreja remanescente como um todo. Mas, num sentido bem real, o adventismo tem de enfrentar seu lado sombrio. Tem de continuar indo em frente e deixar que Deus o molde e o transforme naquilo que ele pretende que o adventismo seja.
Nós provavelmente somos mais “adventistas” do que já fomos. Com isso quero dizer, é claro, que nós somos apaixonados pela volta de Jesus em breve. O motivo disso é que já é tempo — já passou do tempo — de todas as igrejas pararem de promover sua própria variante de cristianismo como a “única e verdadeira” comunidade e se unirem em prol da causa comum de alcançar o mundo para Jesus. Esse foi o profundo desejo de Jesus em João 15: “Com isso conhecerão que vocês são meus discípulos, se vocês amarem uns aos outros”. A marca da verdadeira maturidade cristã é ter esse amor um pelo outro e passar a levar a mensagem de Jesus ao mundo. A oração de Jesus em João 17 deixa claro que ele deseja a unidade de sua igreja. É essa unidade que atrairá o mundo para Jesus Cristo. Quando cristãos brigam entre si, isso apenas confirma para os não crentes a impressão de que o cristianismo é apenas outra instituição humana.
Unidade de propósito é a essência do verdadeiro remanescente da profecia bíblica. Em todos os meus anos de ministério, não consigo me lembrar de alguma vez qualquer um alguns ter se alegrado com o sucesso de uma cruzada evangelística de Billy Graham. Nunca ouvi ninguém louvar a Deus porque Greg Laurie teve cruzada de evangelização bem sucedida. Tenho de me incluir nesse grupo. Por quê? Porque esses homens não faziam parte da “igreja verdadeira”. Infelizmente é possível encontrar essa atitude em muitas estruturas eclesiásticas. Esse não é um fenômeno exclusivo da IASD. Tive de examinar cuidadosamente minhas próprias atitudes ao longo dos anos. Cremos que já é hora de colocar de lado o exclusivismo que, durante séculos, tem aleijado a igreja cristã (veja Gálatas 4.17) e passar à Comissão do Evangelho (Mateus 28.18-20). Estamos convictos de que esse é o sonho de Jesus para sua igreja nestes últimos dias. Cremos que a forma mais elevada de adoração, o caminho que podemos escolher e que dá mais honra a Deus, é seguir Jesus à medida que ele nos conduz. Cremos que seu remanescente são aqueles que obedecem a seus mandamentos de amá-lo plenamente, amar ao próximo como a si mesmos e dedicar-se inteiramente a contar ao mundo sobre ele.
Enquanto escrevo isto, não sei o que o futuro reserva para mim. Não sei o que nos acontecerá financeiramente. Tenho de dizer que nessa luta tive, num sentido bem real, de enfrentar um lado sombrio de minha própria personalidade. Eu dava valor para o fato de ser um respeitado pastor da IASD e das pessoas pensarem bem de mim. Pensar que alguns que eu tinha conhecido e servido no adventismo talvez perdessem o respeito por mim era incrivelmente difícil de aceitar. Tive, num sentido bem real, de me arrepender por ter amado o louvor dos homens mais do que o louvor de Deus. Agora decidi que, “quanto a mim e à minha casa, nós serviremos ao Senhor”. Nele nós encontraremos nosso descanso e segurança. E aguardaremos ver como Deus nos conduzirá e como conduzirá vocês nos meses e anos pela frente. Oramos por vocês e pedimos que orem por nós.
Esperamos que um dia a igreja adventista encare algumas dessas questões. Oramos para que em breve ocorra um movimento corajoso feito pelos líderes para reexaminar as “colunas da fé” e peço a Deus que lhes dê a coragem de estudar abertamente, sem receio, os ensinos fundamentais e ver o que as Escrituras ensinam, sem preocupação com o que acontecerá caso se descubra que tem havido alguns erros ao longo do caminho. É preciso coragem para enfrentar temas difíceis. Mas a coragem é uma das qualidades que caracterizou os adventistas no passado. Estamos confiantes de que a mesma qualidade ainda existe.
Achamos que a igreja não sofrerá durante muito tempo como resultado desse estudo. Talvez a imagem de que os adventistas são a única e exclusiva igreja remanescente caia por terra. Talvez o Juízo Investigativo também vá para o cemitério teológico. Talvez haja uma abordagem totalmente nova quanto ao sábado. Talvez o sábado se torne uma disciplina espiritual sugerida, ao invés de um dever moral. O nome “adventista do sétimo dia” talvez seja reduzido apenas a “adventista”, para manter o foco em Jesus, ao invés de na lei. A vida saudável talvez seja ensinada como um estilo de vida sugerido, e não como uma exigência que se confunde com a salvação. Talvez a igreja possa se tornar conhecida como uma igreja que verdadeiramente se baseia na Bíblia e apenas na Bíblia. Talvez ocorram até mesmo alguns pedidos de desculpa àqueles grupos cristãos que foram insultados e ofendidos pelos “evangelistas”, que os chamaram de “apóstatas” e “Babilônia”! Talvez o foco da evangelização passe a ser alcançar os 130 milhões de pessoas sem igreja neste país [os Estados Unidos], em vez daqueles já ligados a uma igreja. Talvez os adventistas ao redor do mundo se tornassem conhecidos como um povo com profundo desejo de alcançar pessoas para Jesus, cooperando com outros grupos cristãos e sendo totalmente altruístas em usar para a causa de Cristo os imensos recursos da igreja.
Talvez tudo isso soe como um sonho, mas você consegue imaginar como Deus poderia abençoar uma organização com esse tipo de coragem e autenticidade? Imagine como aqueles que buscam a Deus e também os crentes respeitariam essa espiritualidade autêntica. Mas isso não acontecerá se não houver pelo menos alguns que estejam orando por um reavivamento e unidade verdadeiros no corpo de Cristo, a unidade que ocorre quando todos os cristãos verdadeiros levam João 17 a sério. Quando os cristãos começarem a amar um ao outro e a falar das boas novas ao mundo, em vez de se ajuntar em grupinhos denominacionais exclusivos e de fingir que são únicos, haverá um reavivamento de proporções gigantescas. Mas isso não acontecerá, se não houver ao menos uns poucos que estejam dispostos a se levantar e dizer o que pensam. Acontece que sabemos que há muitos adventistas do sétimo dia, inclusive alguns pastores, administradores e professores, que têm esse sentimento. Mas nada acontecerá enquanto isso só acontece em pequenas conversas nos bastidores. Alguns de nós precisamos ter a coragem de abrir a boca e dizer a verdade. Cremos que algum dia Deus realizará essas coisas no adventismo. Estaremos todos os dias orando simplesmente por um reavivamento assim.
Amamos todos vocês!
Em Jesus Cristo, nossa segurança e descanso,
Greg e Paula Taylor
Minha jornada bíblica
(Seção de estudo bíblico)
Para começar, Paula e eu fizemos jornadas separadas em nosso estudo. Cada um tinha questões de interesse particular. Portanto, procuramos cada um fazer o próprio estudo e não influenciar o outro quanto ao resultado. Conduzirei você ao longo da minha jornada. Primeiro, decidi que a Bíblia toda é a Palavra de Deus e é inspirada por ele. Segundo, tentei aplicar o princípio de estudo da Bíblia que deixa o Novo Testamento interpretar o Velho e não o contrário. Ambos são inspirados, mas é preciso dar maior ênfase ao Novo Testamento, e o motivo é o seguinte. A expressão Novo Testamento ou Nova Aliança significa a mesma coisa que testamento ou algum outro contrato legal. Minha esposa e eu temos feito diversos testamentos durante nosso casamento. Fizemos um testamento antes de ter filhos. Providenciamos outro testamento depois do nascimento de nosso primeiro filho. Fizemos ainda outro após nosso segundo filho nascer e recentemente tornamos a atualizar nosso testamento. Agora, se nós dois morrermos em um acidente, qual testamento valeria? É claro que o mais recente ou o mais novo. A mesma coisa se aplica ao Novo e ao Velho Testamentos. Há ensinos importantes no Velho Testamento, há muitas histórias e informações que nos ajudam a entender melhor a Deus. Mas buscar basicamente no Velho Testamento a aplicação da vontade de Deus em nossas vidas seria tirar as coisas da sua devida ordem. O Novo Testamento foi escrito para nos dar uma revelação mais completa da operação de Deus na história humana. O Novo Testamento nos dá a mais completa de todas as revelações, Jesus Cristo. Visto que temos de aplicar a mensagem de Jesus à nossa vida pessoal como cristãos, como pessoas que vivem após a cruz, as epístolas foram dadas especificamente com esse propósito. Jesus veio, por exemplo, para cumprir boa parte do sistema do judaísmo. Ele veio cumprir alguns dos aspectos da Velha Aliança ou Velho Testamento. Como sabemos quais aspectos? Os evangelhos não especificam quais. As epístolas fazem isso. Assim, fui primeiro ao Novo Testamento (ou Aliança) e especificamente às epístolas para ver o que é ensinado ali sobre a aplicação do sábado aos cristãos de hoje. Em seguida fui à vida de Jesus para ver se, em sua vida e ministério, ele deu margem para essa interpretação. Por fim, voltei ao Velho Testamento para ver se o que está escrito ali concorda com as epístolas e com Jesus no que diz respeito a esse assunto.
O primeiro texto que estudei fica no capítulo 2 de Colossenses. No livro de Colossenses Paulo está tratando de uma heresia sincretista que era uma mistura de adoração de anjos e práticas ascéticas. Mas, misturado nisso tudo, havia o elemento judaizante (judeus legalistas que estavam insistindo na observância da lei judaica) que estava tentando influenciar esses cristãos novos. Na passagem de Colossenses 2 o foco está no aspecto judaico da heresia. Começando com o versículo 11, Paulo se concentra no fato a circuncisão ter sido substituída pelo batismo, de modo que não mais se exige a circuncisão. Então ele destaca que o registro de nossos pecados foi pregado na cruz assim que viemos a aceitar Jesus. Por fim, Paulo examina as duas últimas características judaicas. Repare nos versículos 16 e 17:
“Ninguém, pois, vos julgue por causa de comida e bebida, ou dia de festa, ou lua nova, ou sábados, porque tudo isso tem sido sombra das coisas que haviam de vir; porém o corpo é de Cristo”.
Paulo está dizendo que os Colossenses não devem deixar esses judaizantes levá-los a se sentirem culpados por causa das leis alimentares, ou das festas, luas novas ou sábados, porque isso fazia parte do sistema que prefigurava Cristo ou apontava para ele. Pois bem, durante toda minha vida na igreja me ensinaram que aqui os sábados se referiam aos sábados cerimoniais das festas judaicas, não ao sábado semanal. Mas o que me surpreendeu foi descobrir que definitivamente esse não é o caso. Em todo o Velho Testamento essa mesma expressão é usada. Paulo simplesmente está repetindo uma fórmula empregada vez após vez para se referir a todo o velho sistema, inclusive ao sábado semanal. Essa mesma expressão é encontrada inúmeras vezes em ordem ascendente ou descendente. Não pode haver dúvida sobre o que ele quis dizer. Os “sábados” nessa expressão comum do Velho Testamento sempre se referem ao sábado semanal. Tentar fazer com que essa passagem de Colossenses se refira às festas cerimoniais sabáticas é ignorar o uso da expressão no Velho Testamento.
Para começar, o capítulo 23 do livro de Levítico enumera todas as festas religiosas. No topo da lista está o sábado semanal. Em seguida as outras festas são alistadas. Agora dê uma olhada em 1Crônicas 23.31: “e em cada oferecimento dos holocaustos do Senhor, nos sábados, nas Festas da Lua Nova e nas festas fixas…” os israelitas deviam cuidar das necessidades dos sacerdotes e do tabernáculo. Essa é uma clara referência às festas semanais, mensais e sazonais. O texto de 2Crônicas 2.4 diz basicamente a mesma coisa (veja também Neemias 10.33, Oseias 2.11 e Ezequiel 45.17). Em todo o Velho Testamento usa-se a mesma expressão. As celebrações semanais, mensais, sazonais e às vezes anuais são incluídas. Às vezes a sequência é invertida, mas o mesmo princípio se aplica. Os “sábados” mencionados em Colossenses 2.16-17 estão claramente se referindo aos sábados semanais. Seria redundante e, do ponto de vista literário, seria totalmente estranho aquela ser uma referência às festas fixas. O sentido seria: “Ninguém vos julgue por causa de dias de festas, ou luas novas ou dias de festa”. Isso não faria sentido. Até mesmo Samuele Bacchiocchi (um autor adventista) admite isso. Ele concorda que aqui a referência é ao sábado semanal,1 embora diga que não é a guarda correta do sábado que está sendo examinada aqui, mas a perversão da guarda desse dia.2
O clara dificuldade bíblica para a teoria de Bacchiocchi é que o texto continua descrevendo esses sábados e festas como “sombra das coisas que haveriam de vir”, das quais a “realidade é Cristo”. Essas festas religiosas, inclusive o sábado, eram símbolos que apontavam para Jesus, que viria. Eram prefigurações tipológicas de Jesus. Como a perversão de um símbolo poderia ser sombra ou prefiguração de Cristo? A tradução mais razoável do texto é que o sábado semanal está incluído no sistema cerimonial/sacrificial que foi cumprido em Cristo! Nenhuma outra explicação fez sentido para mim. Nenhuma outra interpretação faz justiça ao contexto ou à expressão encontrada no Velho Testamento.
Na primeira vez que li isso da maneira que Paulo claramente quis que fosse entendida, não consegui acreditar no que estava lendo! Aqui Paulo estava fazendo uma radical declaração de transição! O sábado cumprido em Cristo? Será que podia ser verdade? Muitas perguntas pipocaram em minha mente. E os Dez Mandamentos não são eternos? E o sábado instituído na criação? Eu tinha muitas perguntas. Eu tinha examinar e descobrir sobre tudo isso.
A etapa seguinte foi o livro de Gálatas, no qual Paulo torna a se referir ao sábado em sua dura censura à heresia judaizante que ameaçava as igrejas da Galácia. Aqui Paulo explica o propósito da lei a esses crentes gentios. Para se ter uma ideia do argumento que ele está usando, temos começar lá atrás em Gálatas 3.16.
“Ora, as promessas foram feitas a Abraão e ao seu descendente. Não diz: ‘E aos descendentes’, como se falando de muitos, porém como de um só: ‘E ao teu descendente’, que é Cristo. E digo isto: uma aliança já anteriormente confirmada por Deus, a lei, que veio quatrocentos e trinta anos depois, não a pode ab-rogar, de forma que venha a desfazer a promessa.”
O que Paulo está dizendo é que a aliança com Abraão foi feita antes da lei. E foi feita tendo Cristo em mente. Vamos continuar com o versículo 18.
“Porque, se a herança provém de lei, já não decorre de promessa; mas foi pela promessa que Deus a concedeu gratuitamente a Abraão. Qual, pois, a razão de ser da lei? Foi adicionada por causa das transgressões, até que viesse o descendente a quem se fez a promessa…”
Paulo está dizendo que a lei foi acrescentada bem depois das promessas a Abraão, até que Cristo viesse. Houve um claro começo e um claro fim da lei. É crucial entender isso a fim de acompanhar o argumento de Paulo. Repare agora nos versículos 23 e 24.
“Mas, antes que viesse a fé, estávamos sob a tutela da lei e nela encerrados, para essa fé que, de futuro, haveria de revelar-se. De maneira que a lei nos serviu de aio para nos conduzir a Cristo, a fim de que fôssemos justificados por fé. Mas, tendo vindo a fé, já não permanecemos subordinados ao aio.”
Paulo prossegue seu exame do assunto, concluindo o capítulo três com a famosa declaração do versículo 29: “E, se sois de Cristo, também sois descendentes de Abraão e herdeiros segundo a promessa”. O que Paulo está dizendo é que a promessa do Cristo veio antes da lei. Ela é independente da lei. A lei foi acrescentada para nos mostrar nossa necessidade de Cristo. Ela foi nosso tutor para nos levar a Cristo, para que pudéssemos ser justificados pela fé. Fica claro que Paulo está destacando que a lei era uma instituição temporária para nos mostrar nossa necessidade de Cristo. Mas, quando aceitamos Jesus, nós estamos debaixo da aliança que foi anterior à circuncisão e anterior à lei, estamos debaixo da aliança com Abraão. Agora o cristão está junto com o justo Abraão, um herdeiro da promessa, ignorando toda a era da lei! Nunca antes eu havia percebido o sentido desse versículo! Eu tive de ler e reler o versículo. Quero incentivá-lo a sentar com o livro de Gálatas aberto e a ler e digerir isso por você mesmo. A mensagem é tão poderosa e libertadora! Ela também nos prepara para entender o restante do livro.
No capítulo quatro Paulo continua com sua argumentação e examina o absurdo de voltar “aos rudimentos” ou “rudimentos fracos e pobres” que, de acordo com o contexto, são uma clara referência a voltar a uma vida baseada na lei. Então nos versículos 9 a 11 ele diz o seguinte:
“Mas agora que conheceis a Deus ou, antes, sendo conhecidos por Deus, como estais voltando, outra vez, aos rudimentos fracos e pobres, aos quais, de novo, quereis ainda escravizar-vos? Guardais dias, e meses, e tempos, e anos. Receio de vós tenha eu trabalhado em vão para convosco.”
Eu mal conseguir crer nos meus olhos quando li esses versículos. Eu os havia lido muitas vezes antes, mas nunca tinha entendido. Dessa vez parecia que as palavras saltavam fora da página, como as “imagens ocultas” que mencionei na carta. Será que seria possível Paulo ser mais claro do que isso? Conhecendo o padrão dos dias santos no Velho Testamento, de repente ficou claro para mim o que estava em jogo aqui. Os judaizantes vinham ensinando a esses novos cristãos que eles tinham de guardar o sábado e as demais festas judaicas como parte de seu compromisso com Cristo. Os dias, meses, tempos e anos seguem o mesmo padrão do sistema de dias santos judaicos, inclusive o sábado. Os judaizantes estavam dizendo aos gálatas que tinham de guardar o sábado e as outras festas. Paulo está claramente dizendo que observar esses dias santos não é algo exigido dos cristãos. Ele entende que fazer isso poderia ser perigoso para a maturidade deles como cristãos. Ele está dizendo que essas coisas não têm valor porque a lei era uma instituição temporária. Os cristãos são aceitos com base no cumprimento da lei por Jesus e tratados como descendentes de Abraão antes da chegada da lei! Para mim pareceu que a mensagem de Gálatas literalmente ganhou vida. De repente aquelas passagens difíceis de entender faziam todo sentido!
O livro de Gálatas tem um único tema básico do princípio ao fim: não volte a guardar a lei, o que inclui o sábado. Embora haja muita instrução sobre a vida moral, quanto a isso, nem Gálatas nem qualquer outro dos escritos de Paulo, jamasis se recorre à lei. Ele coloca o sábado junto com as coisas que não são mais obrigatórias e são possivelmente perigosas, caso sejam colocadas como parte do processo da salvação. Paulo claramente ensina moralidade responsável, e eu entrarei nesse assunto mais adiante, mas o apelo de Paulo é que Cristo — e não a lei — viva em você.
O texto seguinte que estudei foi Romanos 14. Ali Paulo adota uma abordagem mais leve. Ali os cristãos judeus e gentios estão vivendo lado a lado. Há alguns que estão extremamente preocupados com comida que talvez tenha sido oferecida aos ídolos, e outros estão dizendo que os ídolos não existem, de modo que podem comer simplesmente qualquer coisa. Mas alguns estão julgando a espiritualidade do outro com base nesses comportamentos. Paulo entra para ser mediador na disputa. É nesse contexto que torna a parecer a questão da santidade de certos dias em relação a outros. Aqui a questão é de unidade cristã, não de exigência para a salvação, de modo que Paulo é muito mais brando ao tratar do assunto. Repare nos versículos 5 a 6.
“Um faz diferença entre dia e dia; outro julga iguais todos os dias. Cada um tenha opinião bem definida em sua própria mente. Quem distingue entre dia e dia para o Senhor o faz; e aquele que não distingue, para o Senhor não o observa.”
Usando um linguajar bem mais brando, Paulo torna a afirmar que a santidade de determinados dias não é mais uma dificuldade para os cristãos. Desde que as pessoas estejam plenamente convencidas em suas mentes, ele não tem nenhuma dificuldade com isso. Mas isso não deve se tornar ocasião para julgar os outros. Conforme já vimos, o sábado jamais deve ser confundido com a salvação de alguém. De novo Paulo faz do sábado um assunto irrelevante para os cristãos do Novo Testamento. As instruções do apóstolo têm algumas fortes implicações para aqueles que, no passado, fizeram do sábado “uma verdade salvadora” e mediante a qual julgamos a “lealdade” dos outros. Tive de examinar seriamente algumas das coisas que ensinei no passado.
Em seguida, em meu estudo, fui aos capítulos 3 e 4 de Hebreus. Não disponho de tempo nem de espaço para fazer um estudo completo de nenhum desses dois capítulos, mas seria bom que você lesse esses capítulos antes de ler meus comentários. Eu notei que a palavra “hoje” é usada 5 vezes. Também notei que os filhos de Israel não entraram no descanso de Deus por causa da incredulidade. No deserto eles estavam descansando a cada semana no dia de sábado porque, caso não fizessem isso, seriam executados por quebrar o sábado. Mas eles fracassaram por causa da incredulidade. Mesmo quando Josué os liderou até a terra prometida, ainda assim não entraram no descanso. Preste atenção em Hebreus 4.3:
“Nós, porém, que cremos, entramos no descanso…”
(Essa é a chave para entender a passagem. Entrar no descanso de Deus é uma questão de crer em Jesus.) Os versículos 6 e 7 dizem:
“Visto, portanto, que resta entrarem alguns nele e que, por causa da desobediência, não entraram aqueles aos quais anteriormente foram anunciadas as boas-novas, de novo, determina certo dia, hoje, falando por Davi, muito tempo depois, segundo antes fora declarado: hoje, se ouvirdes a sua voz, não endureçais o vosso coração. Ora, se Josué lhes houvesse dado descanso, não falaria, posteriormente, a respeito de outro dia. Portanto, resta um repouso [no grego a palavra é sabbatismos, que significa descanso parecido com o sábado] para o povo de Deus. Porque aquele que entrou no descanso de Deus, também ele mesmo descansou de suas obras, como Deus das suas.”
O autor de Hebreus está dizendo que aqueles que acreditam em Jesus estão tendo um descanso parecido com o sábado. O momento de entrar nesse descanso é no chamado hoje! Nessa passagem a palavra “hoje” é repetida cinco vezes. O descanso que é parecido com o sábado e nos é oferecido em Cristo é experimentado “hoje”: hoje e cada dia, à medida que na retidão e no descanso de Cristo, descansamos de qualquer confiança em nossas próprias obras. Aqui o Novo Testamento torna a indicar que o sábado é uma instituição cumprida. Aqui vemos que Jesus é nosso descanso parecido com o sábado. Quando confiamos nele pela fé, experimentamos o descanso semelhante ao sábado em cada dia de nossas vidas! Que lindo conceito! Jesus é meu sábado e seu sábado quando diariamente confiamos nele. Meus olhos estavam começando a ver outra perspectiva que eu nunca tinha visto antes.
Existem algumas pessoas que têm tentado fazer com que esse texto seja uma justificativa para a permanência da guarda do sábado, mas isso ignora o contexto da passagem. Essa interpretação também ignora o contexto maior do livro de Hebreus. O livro inteiro é dedicado a mostrar a superioridade de Cristo sobre todo sistema do Velho Testamento. Por exemplo, Hebreus 1 enfatiza a superioridade de Cristo sobre a totalidade das Escrituras do Velho Testamento (1.1-3). Nos versículos 4 e seguintes ele é apresentado como alguém superior a todos os anjos. No capítulo 3 ele é visto como alguém superior a Moisés. Nos capítulos 5 a 7 ele é superior a todos os sacerdotes, introduzindo uma nova ordem de sacerdócio, a ordem de Melquisedeque. Nos capítulos 8 a 10, ele é um santuário/templo maior, um sacrifício maior, uma aliança maior. O livro inteiro de Hebreus trata de Jesus como alguém melhor do que todo o sistema do Velho Testamento e da velha aliança e como o cumprimento desse sistema. Tentar dizer, no meio desse tema, que o sábado é um dia obrigatório para os cristãos, é perder de vista não apenas o contexto dos capítulos 3 e 4, mas o contexto maior do livro. A afirmação lógica que o autor está fazendo é que Jesus é um sábado melhor do que o velho dia literal de descanso uma vez por semana, mas ele é nosso descanso hoje e a cada dia, à medida que confiamos nele! Ele é o templo verdadeiro, a verdadeira Páscoa, a verdadeira lei, o verdadeiro sábado! Quando me lancei a estudar tudo isso, meu coração simplesmente ardia dentro de mim enquanto eu via o significado de Jesus em Hebreus.
As poucas passagens seguintes de Hebreus apenas ressaltam aquilo que o estudo já havia me ensinado, mas deixaram ainda mais claro aquilo que o Novo Testamento mantém do Velho. Observe alguns destes versículos escolhidos de Hebreus 8 a 10. Por favor, não aceite sem mais nem menos minha palavra a respeito de tudo isso. Apanhe sua Bíblia e estude por você mesmo o que estou dizendo aqui. Estude o contexto e os versículos que existem entre os trechos que escolhi para ver se as coisas são assim mesmo. Vamos começar com o capítulo 8 logo após a expressão, no versículo 5, que chama de “sombra das coisas celestes” o sistema do templo (interessante semelhança com Colossenses 2.16-17). Repare nos versículos 6 e 7.
“Agora, com efeito, obteve Jesus ministério tanto mais excelente, quanto é ele também Mediador de superior aliança instituída com base em superiores promessas. Porque, se aquela primeira aliança tivesse sido sem defeito, de maneira alguma estaria sendo buscado lugar para uma segunda.”
Hebreus 9.13:
“Quando ele diz Nova [Aliança], torna antiquada a primeira. Ora, aquilo que se torna antiquado e envelhecido está prestes a desaparecer.”
Hebreus 9:15:
“Por isso mesmo, ele é o Mediador da nova aliança, a fim de que, intervindo a morte para remissão das transgressões que havia sob a primeira aliança, recebam a promessa da eterna herança aqueles que têm sido chamados.”
Hebreus 10.1:
“Ora, visto que a lei tem sombra dos bens vindouros, não a imagem real das coisas, nunca jamais pode tornar perfeitos os ofertantes, com os mesmos sacrifícios que, ano após ano, perpetuamente, eles oferecem.”
Hebreus 10.9:
“…Remove o primeiro para estabelecer o segundo.”
Incentivo você, que está lendo minhas reflexões, a gastar algum tempo para mergulhar no ensino de Hebreus 8 a 10! Há muito alimento nesses capítulos. Passemos agora para a minha próxima etapa, 2Coríntios 3.5-7.
“…a nossa suficiência vem de Deus, o qual nos habilitou para sermos ministros de uma nova aliança, não da letra, mas do espírito; porque a letra mata, mas o espírito vivifica. E, se o ministério da morte, gravado com letras em pedras, se revestiu de glória, a ponto de os filhos de Israel não poderem fitar a face de Moisés, por causa da glória do seu rosto, ainda que desvanecente.”
Enquanto eu estudava essas passagens, me convenci de que uma mudança radical havia ocorrido no evento da cruz. Era algo muito maior do que eu já tinha entendido antes. Comecei a perceber que a parede divisória de hostilidade derrubada por Cristo e mencionada em Efésios 2.11-19 incluiu, sim, de verdade a totalidade da lei, até mesmo as leis específicas que separavam judeus e gentios. O sábado, as festas, as leis de pureza e impureza, o sistema sacrificial, a circuncisão, tudo isso foi cumprido em Jesus. Dessa maneira Cristo tornou de verdade todos os crentes um só nele.
Outra passagem que examinei foi Atos 15. Ali encontramos os líderes da igreja reunidos em Jerusalém para decidir quais leis seriam obrigatórias aos cristãos gentios. Havia aqueles (os judaizantes) que estavam ensinando que, a menos que as pessoas fossem “circuncidadas segundo o costume de Moisés, não podiam ser salvas” (v.1). Esses judaizantes, que eram da seita dos fariseus e tinham se tornado cristãos, estavam impondo a exigência da circuncisão e da guarda da lei de Moisés a todos os novos convertidos. Paulo e Barnabé estavam inflexíveis de que essas exigências não deviam ser impostas aos novos crentes. Pedro concordou com eles e disse (v. 10-11): “Agora, pois, por que tentais a Deus, pondo sobre a cerviz dos discípulos um jugo que nem nossos pais puderam suportar, nem nós? Mas cremos que fomos salvos pela graça do Senhor Jesus, como também aqueles o foram.” Em seguida, ele passa a destacar que somos salvos pela graça e não pela lei.
A esta altura é necessário ressaltar o fato de que o sinal que indicava que alguém havia se tornado judeu era a circuncisão. Assim que era circuncidado, exigia-se da pessoa que guardasse todas as leis. Isso incluía o sábado, que era o sinal contínuo de lealdade à Velha Aliança, conforme logo veremos. É óbvio que o sinal da circuncisão não era facilmente visível a menos que os homens estivessem em um vestiário no ginásio de esportes, mas o sinal contínuo do sábado era bem óbvio, e tanto homens quanto mulheres participavam desse sinal. Deixar de guardar o sábado era punível com a morte (Êxodo 31.14). Mas não se esperava o sinal do sábado daqueles que não eram oficialmente judeus. O sinal de entrada da circuncisão era um pré-requisito para a entrada na comunidade judaica. Assim que alguém era circuncidado, estava então debaixo da obrigação de guardar todo o restante da lei, inclusive o sábado.
As regras sobre o sábado envolviam não carregar carga, não acender fogo, não viajar e, naturalmente, não trabalhar de nenhuma maneira. Isso se aplicava aos judeus e também ao estrangeiro dentro das cidades ou casas dos judeus. Não se aplicava aos estrangeiros que “residissem temporariamente entre eles”. Somente aqueles que morassem dentro das cidades tinham a exigência de guardar o sábado. Havia também as leis alimentares e as leis sobre impureza, as quais faziam parte desse sistema e marcavam os judeus como pessoas separadas do restante do mundo ao redor. É claramente a essas exigências que Pedro estava se referindo como um fardo pesado demais para carregar.
Em Atos 15, os líderes da igreja chegaram a uma solução. Eles decidiram não impor aos novos convertidos nenhuma regra específica que fizesse parte do sistema pactual do judaísmo. Eles não exigiram o sinal de entrada, de modo que o restante das leis também não se aplicava, da mesma maneira como não exigimos que alguém não batizado siga todas as diretrizes de determinada igreja. As regras que eles exigiram tinham origem na aliança com Noé (veja Gênesis 6—10; essa aliança incluía adorar o Deus verdadeiro, evitar comer animais estrangulados e sangue e evitar a imoralidade sexual). Os judeus de todas as partes consideravam que essas eram exigências feitas a todas as pessoas, visto que a aliança foi com Noé. O texto de Levítico 17 e 18 amplia e define o significado dessas regras. Em cada caso mencionado em Levítico 17 e 18, fica claro que são obrigatórios para o “estrangeiro que vive temporariamente entre vós” (observe a clara distinção entre este grupo e o “estrangeiro que está dentro de vossas cidades”). Repare também que em Atos 15.20 essas regras são consideradas também obrigatórias para os novos convertidos. O motivo é que em cada cidade havia judeus que liam todos os sábados a lei de Moisés e eles esperavam que alguém que temesse ao Senhor seguisse estas diretrizes, mesmo que não fizesse parte da comunidade judaica circuncidada e guardadora do sábado. Por quê? Porque os judeus acreditavam que elas eram exigências universais baseadas na aliança noaica. Para que qualquer judeu respeitasse um cristão, era necessário que o crente fosse visto pelo menos como seguidor das leis dadas a Noé. Então, o concílio da igreja primitiva decidiu exigir de todos os cristãos a obediência à estipulações da aliança com Noé, mas não exigiu obediência às regras mosaicas. A decisão foi repetida na carta enviada às igrejas gentílicas (v. 28-29). O resultado foi grande alegria na igreja.
À medida que eu ia estudando, o que se tornou claro como cristal foi que o sábado não era uma das exigências impostas aos novos crentes. Além disso, o argumento que alguns têm apresentado (aquele que eu costumava usar) simplesmente não se bate. O argumento diz que, como não houve nenhum grande debate sobre o sábado na igreja primitiva e como se falou muito sobre a circuncisão, então ainda é necessário exigir a guarda do sábado. Se davam tanta importância à circuncisão, será que o sábado não teria recebido importância ainda maior? Na verdade, não. Para quem não entrava na comunidade judaica mediante a circuncisão não havia nenhuma exigência de guarda do sábado. O sinal de entrada vinha primeiro. O sinal contínuo era irrelevante, caso o sinal inicial não estivesse presente.
Outro argumento que tenho ouvido e que eu mesmo usei certa vez é o costume de Paulo de ir à sinagoga no sábado. Isso necessariamente significa que ele achava que isso ainda era obrigatório. Certo? Não necessariamente. O problema com esse argumento é que ele deixa de levar em conta a motivação de Paulo em ir ali. Paulo tinha o costume de ir à sinagoga para evangelizar os judeus. Ele ia primeiro até os judeus (Romanos 1.16), sempre que fosse a uma nova cidade. Ensinava ali até ser expulso e, então, se encontrava com os gentios.
Outro texto que é frequentemente apresentado, especialmente em círculos adventistas, é todo o cenário de Apocalipse ensinado pela igreja adventista. De acordo com essa ideia, o sábado, por ser o selo ou sinal da velha aliança (veja Êxodo 31.12-18), tem, portanto, de ser o “selo de Deus” em Apocalipse. Assim muitos concluem que o sábado é necessariamente o derradeiro teste de lealdade para toda a humanidade. Essa ideia também enfatiza Apocalipse 12.17, que retrata a igreja remanescente como aquela que guarda os mandamentos de Deus e tem o testemunho de Jesus. Há dois problemas com essa conclusão. Primeiro, em nenhum texto o Novo Testamento chama o sábado de Selo de Deus. Aliás, no Novo Testamento o Selo de Deus é o Espírito Santo (veja Efésios 1.13-14; 4.30; 2Coríntios 1.22). Ignorar esse claro ensino é perder de vista a mensagem toda que Apocalipse está tentando transmitir. Em segundo lugar, a palavra que João usa para se referir a mandamentos (entole, em grego) nunca é usada nos escritos de João para se referir aos Dez Mandamentos.3 Quando João está falando da lei em geral ou dos Dez Mandamentos em particular, ele sempre usa a palavra “lei” em grego, que é nomos. Quando João usa entole, ele faz isso junto com as instruções de Jesus sobre o amor prático de uns pelos outros. Assim, a tradução correta de Apocalipse 12.17 (em harmonia com uso de entole por João) é “aqueles que verdadeiramente amam o próximo e estão contando ao mundo sobre Jesus”. Isso também se harmoniza perfeitamente com o tema do Selo de Deus em Apocalipse. De acordo com João 13—16, o Espírito Santo é o outro Consolador. Ele vive em nós e nos dirige. Ele é Jesus habitando em nossas vidas. O Selo de Deus dos últimos dias simboliza aqueles que têm uma caminhada pessoal diária com Jesus mediante a atuação do Espírito Santo. Isso é o que significa ser selado. Essa é a mesma mensagem de Hebreus 3 e 4. Quando estamos descansando em Jesus hoje e todos os dias, ele é nosso sábado. O Espírito é a garantia de nossa herança (Efésios 4.14)! Em resumo, o Selo de Deus é Jesus vivendo em nós mediante a atuação do Espírito Santo. A marca da besta seria, por sua vez, aqueles que escolhem não crer, que se recusam a aceitar o dom da graça, que se recusam a descansar em Jesus e, em vez disso, escolhem depender de outra maneira. Aqueles que escolhem depender de suas próprias obras em vez de confiar no único Filho de Deus têm a marca da besta.
Passei bastante tempo na seção de aplicação (isto é, nas epístolas) do Novo Testamento. Ficou claro que não permanece nenhuma exigência de guardar o sétimo dia da semana. O que se diz alto e bom som nas epístolas do Novo Testamento é que Jesus cumpriu o sábado. A ênfase no dia foi, no mínimo, diminuída. Ele não deve ser usado como um assunto que cause divisão ou como uma ordem obrigatória para cristãos gentios. Não deve ser visto como um teste de lealdade. Em vez disso, uma caminhada diária com Jesus por meio da atuação do Espírito Santo é o novo selo ou teste.
A pergunta seguinte que precisei fazer foi: O que Jesus ensinou sobre o sábado e que importância ele atribuiu ao sábado? Eu lembrei que Jesus veio sob a lei para obedecer perfeitamente à lei (Gálatas 4.4-5), de modo que teve de viver debaixo de todas as exigências da lei. Ao mesmo tempo, eu precisava ver se ele ensinou e viveu de tal maneira que criou as condições para o tema de cumprimento ou, então, se ensinou uma teologia continuísta.4 Comecei com Mateus 5.17-18. Jesus diz:
“Não penseis que vim revogar a Lei ou os Profetas; não vim para revogar, vim para cumprir. Porque em verdade vos digo: até que o céu e a terra passem, nem um i ou um til jamais passará da Lei, até que tudo se cumpra.”
À primeira vista, parece que esse texto indica que a teoria da continuidade é o ensino correto de Jesus. Mas um exame mais detalhado revela o contrário. Primeiro, eu reparei na expressão “a lei e os profetas”. Aqui Jesus não está se referindo especificamente à lei dos Dez Mandamentos. Ele está usando a palavra “nomos” para se referir a todos os cinco primeiros livros de Moisés. “Os profetas” se referem ao restante do Velho Testamento. Se um “i” ou um “til” não podem passar da lei, então não devemos misturar um tipo de tecido com outro, temos de aplicar a pena de morte em quem quebrar o sábado, não podemos ter relações conjugais pelo menos até sete dias depois do fim do ciclo menstrual da mulher. Temos de sacrificar animais e todo o resto. A propósito, no caso de vocês não vegetarianos, vocês não devem misturar laticínios com carne (ou seja, comer Big Mac é pecado). Se você encostar no cadáver de alguém ou de um animal, você tem de ficar de quarentena. Todas as festas religiosas ainda são obrigatórias. Acaso é isso que Jesus está dizendo? Não! Descobri que a palavra chave para entender essa passagem é a palavra “cumprido”. Jesus está dizendo que, ainda que o céu e a terra passem, nenhuma parte da lei pode ser ignorada, nem mesmo a menor das letras. Você não pode fazer essas coisas ou ensinar outros a fazer, até que tudo esteja cumprido.
Se você ler no Evangelho de Mateus e nos outros Evangelhos, a palavra “cumprido” é repetida várias e várias vezes. Apanhe uma concordância bíblica e verifique. Aqui estão alguns exemplos: Mateus 1.22-23 se refere ao cumprimento da profecia sobre a virgem ter um filho; Mateus 2.15 menciona a profecia de que ele seria chamado do Egito; Mateus 8.17 trata da profecia cumprida sobre seu ministério de cura. A lista vai longe. Por fim, em João 19.28-30 encontramos estas palavras:
“Depois, vendo Jesus que tudo já estava consumado, para se cumprir a Escritura, disse: Tenho sede! Estava ali um vaso cheio de vinagre. Embeberam de vinagre uma esponja e, fixando-a num caniço de hissopo, lha chegaram à boca. Quando, pois, Jesus tomou o vinagre, disse: Está consumado! E, inclinando a cabeça, rendeu o espírito.”
Jesus não veio destruir, mas “cumprir”. Esse tema do cumprimento se encaixa perfeitamente naquilo que eu tinha aprendido na seção de aplicação do Novo Testamento. Então, passei para a seção seguinte. Mateus 11.28-30, em que Jesus diz que é o provedor de descanso: “Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos darei descanso”. Imediatamente depois dessa declaração entramos nos debates sobre o sábado. Leia Mateus 12.1-8 e repare, então, nos seguintes pontos. Jesus está com os discípulos atravessando as plantações de cereais; os discípulos estão comendo espigas e são parados pela patrulha religiosa por trabalharem no sábado. Essa não era uma infração do código mosaico, mas apenas alguma das tradições rabínicas, mas é interessante ver como Jesus responde às acusações. Primeiro, ele conta a história de Davi e de como ele, que era o ungido para ser rei, pediu para comer o pão da proposição que ficava no santuário. Essa não era uma coisa lícita de fazer, mas, visto que estava cuidando dos assuntos do rei, fez isso sem ser culpado. A pergunta que me fiz foi: “Que tipo de lei Davi estava quebrando? Uma lei moral ou uma lei cerimonial?” A cerimonial, é claro. Davi não estava dispensado de cumprir as leis morais. Nós sabemos que, quando ele quebrou o sétimo mandamento, pagou um preço elevado. Em seguida, no versículo 5, Jesus lembra aos fariseus que, no templo, os sacerdotes podem violar o sábado ao cumprir seus deveres sacerdotais. Agora tornei a perguntar: “Em que categoria de mandamentos esse ofício sacerdotal se encaixa? O sistema sacerdotal está claramente debaixo do sistema cerimonial. Por acaso os sacerdotes estavam dispensados de obedecer aos mandamentos morais? Podiam mentir, roubar, cometer adultério? Não. É claro que não. Por fim, saltei para João 7.22-23 por um momento. Ali Jesus diz a seus acusadores que a lei mosaica da circuncisão tem precedência sobre o sábado. Se acontecia de ser sábado o dia de ser circuncidado, assim mesmo a circuncisão era realizada. Agora tornei a me perguntar: “Em qual categoria da lei o sábado é colocado em cada um desses cenários?” O cerimonial! Em todas essas vezes a lei cerimonial tem preferência sobre o sábado. Então, em qual categoria isso coloca o sábado? Na cerimonial, é claro! Jesus está dizendo aos acusadores: “Se Davi pôde comer o pão da proposição (quebrando uma lei cerimonial), se os sacerdotes podiam executar o trabalho no templo no sábado, se a circuncisão podia ser realizada no sábado, então o Ungido, o Filho do Homem, certamente é Senhor do sábado. Ele está acima dessas regras cerimoniais.”
Tenho de admitir que essa descoberta me afetou profundamente. Jesus claramente colocou o sábado junto com as coisas que agora sabemos serem sombras do que havia de vir. Ele colocou o sábado junto com o sistema cerimonial. Ele preparou o caminho para Colossenses 2.16-17. Ele se denominou o provedor de descanso e o Senhor do sábado. Isso se encaixa perfeitamente naquilo que encontramos em Colossenses 2.16-17. Marcos 2.27 acrescenta uma declaração a isso: “O sábado foi estabelecido por causa do homem, e não o homem por causa do sábado”. Alguns estudiosos adventistas dizem que isso significa que o sábado foi estabelecido por ocasião da criação e é, portanto, dever moral e obrigatório para todas as épocas. Mas o problema com essa interpretação é que a gramática não dá apoio a isso. Jesus não está fazendo uma declaração universal aqui. Ele está basicamente dizendo que o sábado foi feito para o homem, não o contrário. O contexto ensina claramente que o sábado não está na categoria de deveres morais. Está colocado junto com o sistema temporário ou cerimonial. Essa verdade, encontrada bem no meio dos ensinos de Jesus sobre o sábado, abriu realmente um novo paradigma para mim. Eu sempre estudei essas passagens com o objetivo de mostrar que o sábado é necessariamente o dia do Senhor. (Por esse motivo, nessa linha de raciocínio, a declaração de Apocalipse 1.10 sobre o dia do Senhor tem de estar se referindo ao sábado e não ao domingo.) Ao proceder assim, eu perdia a mensagem clara da passagem. Jesus estava claramente preparando o caminho para uma teologia do cumprimento.
Mais uma observação. A passagem de Mateus começa com Jesus se denominando “provedor de descanso”. O relato de Marcos começa com esta declaração em 2.22: “Ninguém põe vinho novo em odres velhos; do contrário, o vinho romperá os odres; e tanto se perde o vinho como os odres. Mas põe-se vinho novo em odres novos”. No relato de Lucas acerca da mesma história, a mesma introdução é usada (Lucas 5.36-39). Jesus está dizendo, e os autores dos evangelhos entenderam assim, que não é possível se prender ao velho sistema e ao mesmo tempo dar espaço para o verdadeiro sábado, Jesus Cristo. Um ou o outro terá de ceder. Não, Jesus não diz diretamente que o sábado não será mais uma determinação obrigatória na nova era, mas, por meio daquilo que ensinou e pelo exemplo que deu, ele endossa totalmente a ideia. Ele aponta claramente para si mesmo como o cumprimento e adverte contra deixar que a forma nos leve a perder o verdadeiro sábado, ele mesmo.
Outra ilustração dos evangelhos que me deixou atônito, pois eu nunca tinha visto isso antes, está em Lucas 4.16. Para entender o que está por trás, é essencial ter um conhecimento do sistema do sábado no Velho Testamento. Começando em Levítico 23, o sistema é exposto. O texto começa com os sábados semanais, que apontam adiante para as festas mensais e anuais, que por sua vez apontam adiante para os anos sabáticos, que apontam adiante para o derradeiro sábado, o ano de jubileu. Depois da celebração do sétimo ano sabático, que era o 49º ano, o 50º ano deveria ser um ano de jubileu, quando toda a terra devia ser devolvida aos proprietários originais, todos os escravos deviam ser libertados, todo aqueles que trabalhavam de graça para pagar dívidas eram considerados livres de dívida. Era um ano de liberdade. Era esse jubileu que foi mencionado em Isaías 61.1-2 em referência à vinda do Messias. Ele devia introduzir o derradeiro jubileu. Agora, tendo essa informação básica, repare o que Lucas 4.16-21 diz:
“Indo para Nazaré, onde fora criado, entrou, num sábado, na sinagoga, segundo o seu costume, e levantou-se para ler. Então, lhe deram o livro do profeta Isaías, e, abrindo o livro, achou o lugar onde estava escrito: O Espírito do Senhor está sobre mim, pelo que me ungiu para evangelizar os pobres; enviou-me para proclamar libertação aos cativos e restauração da vista aos cegos, para pôr em liberdade os oprimidos, e apregoar o ano aceitável do Senhor. Tendo fechado o livro, devolveu-o ao assistente e sentou-se; e todos na sinagoga tinham os olhos fitos nele. Então, passou Jesus a dizer-lhes: Hoje, se cumpriu a Escritura que acabais de ouvir.”
Nessa declaração Jesus não apenas afirmou ser o Messias, mas se denominou jubileu! Jesus chamou a si mesmo de o derradeiro sábado! Ele estava reivindicando ser o Messias e o sábado personificado. As pessoas sabiam exatamente o que ele estava reivindicando! Tentaram matá-lo por isso. Será que dá para Jesus ser mais claro sobre quem ele é? O sábado é uma pessoa!
Fiquei ainda mais empolgado quando li os versículos e os capítulos seguintes. Jesus expulsa demônios, cura enfermos, purifica leprosos e perdoa pecados — tudo isso são atividades de jubileu! Por fim, no segundo sábado, ele está atravessando as plantações de cereal colhendo e comendo grãos, quando o fariseus aparecem. Jesus está fazendo aquilo que faz parte da instrução de como as pessoas deviam comer durante o ano de jubileu! Coma dos campos! À medida que eu lia todas essas coisas, era como se uma venda estivesse caindo dos meus olhos. Eu estava vendo um Jesus que claramente reivindicava ser o sábado personificado, o provedor de descanso, aquele que veio cumprir a lei.
Por fim, a história da transfiguração começou a assumir novo significado para mim. Você deve lembrar de como Moisés e Elias apareceram no alto do monte com Jesus e de como ele foi transfigurado. Sempre achei que esse era um pequeno retrato do reino, mas não percebia uma importante declaração feita por Deus. Para as pessoas daqueles dias, Moisés representava a lei, os cinco primeiros livros. A lei era, com frequência, chamada simplesmente de Moisés. De acordo com os judeus, o profeta maior da era do Velho Testamento era Elias. Para os judeus ele representava os profetas. Então Pedro sugere que todos permaneçam ali e construam abrigos para passarem o tempo juntos. Em essência ele está dizendo que Elias, Moisés e Jesus estão todos no mesmo nível. De repente “uma nuvem luminosa os envolveu; e eis, vindo da nuvem, uma voz que dizia: ‘Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo; a ele ouvi’” (Mateus 17.5)! Os discípulos ficam aterrorizados, é claro, mas logo depois o que eles veem? Só Jesus. Eu nunca tinha visto o significado disso antes. Jesus, a lei e os profetas estão lado a lado. Deus diz: “Ouçam o meu Filho!” Não é a lei e os profetas mais Jesus. Na era cristã, é só Jesus. Jesus é incomparavelmente superior. Ele é a mais clara revelação de Deus. A lei e os profetas têm seu lugar, mas se tornam insignificantes diante de Jesus. Esse versículo ajudou a ressaltar em minha mente o ensino de Gálatas, Romanos e as demais epístolas: a autoridade final agora não é a lei ou os profetas, mas Jesus (veja Hebreus 1.1-3).
Agora, depois do estudo meticuloso no Novo Testamento, eu estava pronto para voltar ao estudo do Velho Testamento. Sempre achei que o sábado foi estabelecido na criação, que era uma instituição da criação. Diante disso, ele era necessariamente anterior à lei e devia ter importância universal. Então fui até Gênesis 2.1-3, que registra o final da criação. Os versículos 2 e 3 dizem:
“E, havendo Deus terminado no dia sétimo a sua obra, que fizera, descansou nesse dia de toda a sua obra que tinha feito. E abençoou Deus o dia sétimo e o santificou; porque nele descansou de toda a obra que, como Criador, fizera”.
“É isso!” — pensei comigo mesmo. — “O sábado foi estabelecido na criação. Uma vez que isso é verdade, tem de ser uma instituição permanente!” O problema que logo se tornou óbvio com essa conclusão apressada era que ela se baseia em demasiadas pressuposições. Primeiro, aqui não há nenhuma menção a tarde e manhã. Em todos os demais dias da criação há menção a tarde e manhã. Não que não fosse um dia literal, mas nesse dia estava implícito um aspecto de continuidade. Deus pretendia que o descanso que ele havia estabelecido tivesse uma qualidade contínua. Teria permanecido como experiência diária, se não fosse pela entrada do pecado. O descanso teria sido uma realidade perpétua. Segundo, a palavra sábado não é mencionada. Não há nenhuma menção desse dia ter sido sábado. Terceiro, não havia nenhuma necessidade de Adão e Eva descansarem porque eles não ainda não tinham trabalhado. Por fim, não há nenhum registro de que alguém chegou a guardar o sábado desde essa época até Deus ensinar sua guarda ao povo, o que aconteceu no evento do maná e, naturalmente, no monte Sinai. Por outro lado, a instituição do casamento, em Gêneses 2.24, estabelece claramente o casamento como instituição permanente. Há muitas evidências de que, desde então, o casamento era e é parte do modo de vida das pessoas. Mas, no caso do sábado, não há nenhuma menção durante 2.500 anos! O que aprendi é que a ideia de que o sábado foi instituído na criação tem algumas sérias fraquezas. Assim, para ser fiel ao que o texto de fato diz, eu tinha de admitir que duas interpretações são permitidas: 1) o sábado semanal era uma instituição estabelecida na criação, ou 2) o texto indicava uma obra concluída cuja celebração visava impactar o mundo todos os dias daí para a frente.
Não encontramos o sábado mencionado de novo senão em Êxodo 16:23. Deus explica o conceito de sábado ao povo de Israel no evento do maná. À medida que eu estudava, foi ficando evidente que, até esse momento, o povo desconhecia totalmente o sábado. Na mesma época os israelitas haviam recebido alguns mandamentos novos, tais como o sacrifício do cordeiro em Êxodo 12 e a instituição da festa da Páscoa. Eles sabiam sobre a circuncisão, mas agora estavam sendo apresentados ao sábado. O contexto deixa claro que o povo tinha de ser ensinado sobre o que era o sábado.
Mais adiante o ensino sobre o sábado é desenvolvido em Êxodo 20.8-11 como um dos Dez Mandamentos. Ali os israelitas foram instruídos a lembrar do sábado. Alguns têm sugerido que essa é uma referência ao seu estabelecimento na criação. Outros entendem que isso se refere ao episódio do maná. O texto admite ambas as traduções. Observe que aqueles que são obrigados a descansar incluem “o estrangeiro dentro de suas cidades”, que são um grupo diferente do “estrangeiro que reside temporariamente entre vós” de Levítico 17 e 18. Essa ordem não era para todos, ao contrário do que a instituição na criação talvez indicasse. (Veja acima os comentários sobre Atos 15.) Por fim, o versículo 11 diz: “Porque, em seis dias, fez o Senhor os céus e a terra, o mar e tudo o que neles há e, ao sétimo dia, descansou; por isso, o Senhor abençoou o dia de sábado e o santificou”. Agora, à primeira vista, de novo parece que essa era uma instituição estabelecida na criação. E, sem dúvida, o texto admite essa interpretação. Mas também admite a outra ideia, de que, uma vez que Deus é o criador, você deve adorá-lo como tal. Ele abençoar e santificar o sétimo dia na criação é, desde que foi dada a instrução sobre o maná, agora chamado de sábado. O sábado é parte da instituição que veio depois do episódio do maná. Deus tem o direito de exigir isso de seus seguidores porque eles são seres criados por ele. De novo há duas interpretações possíveis: o sábado foi instituído na criação ou foi estabelecido mais tarde pelo mesmo Criador no episódio do maná.
Uma vez que tanto a instituição do sábado na criação quanto a instituição posterior são interpretações que respeitam o texto, eu precisava estudar mais para ver se o contexto do Velho Testamento dá alguma dica sobre qual é a correta. O que me chocou foi a clareza de outros textos sobre esse assunto. Eles declaram exatamente qual a maneira de interpretar esses textos. Não há nenhum motivo para confusão. Uma coisa que descobri em meus estudos sobre questões importantes é que Deus sempre fornece pelo menos três ou mais passagens para garantir que não nos desviemos.5 Ele não nos deixa na situação de ter de adivinhar o sentido nem de ter de ser super-inteligentes ou ter um dom especial para compreender o que é realmente importante. Um dos textos que trouxe luz sobre a questão do sábado ser uma instituição estabelecida para toda a humanidade na criação ou, então, uma lei específica dada a Israel foi Êxodo 31.12-18.
“Disse mais o Senhor a Moisés: ‘Tu, pois, falarás aos filhos de Israel e lhes dirás: “Certamente, guardareis os meus sábados; pois é sinal entre mim e vós nas vossas gerações; para que saibais que eu sou o Senhor, que vos santifica. Portanto, guardareis o sábado, porque é santo para vós outros; aquele que o profanar morrerá; … Pelo que os filhos de Israel guardarão o sábado, celebrando-o por aliança perpétua nas suas gerações. Entre mim e os filhos de Israel é sinal para sempre; porque, em seis dias, fez o Senhor os céus e a terra, e, ao sétimo dia, descansou, e tomou alento”.’ E, tendo acabado de falar com ele no monte Sinai, deu a Moisés as duas tábuas do Testemunho, tábuas de pedra, escritas pelo dedo de Deus.”.6
Repare como é bem claro. O sábado era entre Deus e Israel e foi colocado na tábua da aliança com aquele relacionamento em mente. Deuteronômio 5.2-3 fala a mesma coisa.
“O Senhor, nosso Deus, fez aliança conosco em Horebe. Não foi com nossos pais que fez o Senhor esta aliança, e sim conosco, todos os que, hoje, aqui estamos vivos.”
O texto passa a reiterar os Dez Mandamentos, inclusive o quarto, mas desta vez o motivo para guardar o sábado é que Deus os livrou dos egípcios. É claramente uma referência apenas a Israel, um mandamento que não foi estabelecido antes do êxodo, mas foi um sinal do descanso proporcionado por serem libertados dos egípcios. Neemias 9.13-14 diz:
“Desceste sobre o monte Sinai, do céu falaste com eles e lhes deste juízos retos, leis verdadeiras, estatutos e mandamentos bons. O teu santo sábado lhes fizeste conhecer; preceitos, estatutos e lei, por intermédio de Moisés, teu servo, lhes mandaste.”
Ezequiel 20.10-12 diz:
“Tirei-os da terra do Egito e os levei para o deserto. Dei-lhes os meus estatutos e lhes fiz conhecer os meus juízos, os quais, cumprindo-os o homem, viverá por eles. Também lhes dei os meus sábados, para servirem de sinal entre mim e eles, para que soubessem que eu sou o Senhor que os santifica.”
Essas passagens deixaram claro para mim quando o sábado foi estabelecido. O sábado foi colocado bem no centro da aliança com Israel e era para ser algo entre os israelitas e Deus. Não foi uma instituição dada na criação e obrigatória a todos os povos para sempre. Isso também estava de acordo com o que eu tinha aprendido no Novo Testamento. A mensagem toda da Bíblia se harmoniza. O sábado foi um dia estabelecido por Deus como aliança entre ele e Israel. Jesus veio cumprir a lei e ser nosso sábado. Os cristãos descansam na obra concluída de Cristo, o seu descanso sabático. Como filhos de Abraão, os cristãos são considerados justos por causa de sua fé, como a fé que Abraão teve antes da lei ou da circuncisão. O quadro bíblico é inteiramente harmônico, do começo ao fim.
Agora que a mensagem da Bíblia sobre o sábado havia sido estudada e o ensino estava claro em minha mente, havia alguns empecilhos que pareciam contradizer esse tema constante. Um exemplo era a declaração de que na nova terra estaremos guardando o sábado. Assim fui até aquela passagem para estudá-la por mim mesmo e descobri algumas coisas interessantes. Uma coisa que descobri é que ali diz que as celebrações serão “de uma Festa da Lua Nova à outra e de um sábado a outro” (Isaías 66.23). Será que isso significa que as Festas da Lua Nova devem ser guardadas hoje em dia? Ainda são obrigatórias? Então percebi que o versículo seguinte fala dos moradores andarem e encontrarem os cadáveres daqueles que se rebelaram contra o Senhor. Isso não parecia a Nova Terra. Então, considerando o contexto maior da mesma visão, vemos Isaías dizer: “porque morrer aos cem anos é morrer ainda jovem” (Isaías 65.20). Que cena estranha do céu! O motivo de soar assim tão estranho é que “os Novos Céus e a Nova Terra” de que Isaías está falando não é a Nova Terra de Apocalipse, onde “não haverá mais morte nem tristeza nem choro”. Na verdade, aquelas palavras são a descrição por Isaías de como a terra seria, caso Israel tivesse aceitado o Messias e se tornado a atração central do mundo. As pessoas teriam vindo a Israel para ver o que seu Deus havia feito. Teriam se unido a Israel em adoração, e as bênçãos de Deus teriam tornado essa “Nova Jerusalém” o centro do mundo. Essa profecia era uma daquelas profecias cujo cumprimento estava condicionado à aceitação do Messias. Visto que Israel rejeitou o Messias, ela não se cumpriu.
Outro empecilho para mim foi a declaração de Jesus dizendo a seus discípulos que orassem para que sua “fuga não fosse no inverno nem no sábado” (Mateus 24.20). Acaso isso não indica que o sábado ainda era obrigatório? A resposta a essa pergunta ficou clara para mim quando li Neemias 13, em que Neemias está instituindo algumas regras sobre negócios que alguns estavam realizando no sábado. Alguns gentios que moravam nas proximidades estavam trazendo suas mercadorias para vender aos israelitas no sábado. Isso já tinha sido uma armadilha para Israel, tinha feito com que se afastassem de Deus e, por fim, fez com que fossem levados para o cativeiro. Assim, Neemias fez essa regra que ainda vigorava nos dias de Jesus: “Dando já sombra as portas de Jerusalém antes do sábado, ordenei que se fechassem; e determinei que não se abrissem, senão após o sábado” (Neemias 13.19). Em Mateus 24, a instrução de Jesus foi que os cristãos deviam estar prontos para fugir assim que vissem o exército romano se retirar. Esse seria o sinal para fugirem. O exército romano suspenderia o cerco só por bem pouco tempo. O restante dos moradores pensaria que os romanos haviam desistido e voltaria às suas ocupações habituais. Mas os cristãos deveriam ver isso como a dica para a fuga. Mas deviam orar para que a fuga não fosse no inverno, o que faz sentido, nem no sábado. Mas por que não no sábado? O sábado seria ainda uma instituição obrigatória? Não era o caso, pois os judeus não consideravam que fugir do perigo ou lutar na guerra em dia de sábado fosse quebra do mandamento. Essa não era a questão. A questão era que as portas da cidade estariam fechadas no sábado e isso tornaria praticamente impossível a fuga dos cristãos. A ordem de Neemias me ajudou a ver como isso se encaixa. De novo, o quadro completo fez sentido.
Uma outra questão com a qual eu lutava dizia respeito às exigências morais para os cristãos. Para mim parecia que o restante dos mandamentos do Decálogo ainda eram obrigatórios para os cristãos, ainda que que Romanos e Gálatas e o restante das epístolas ensinem, sim, que nós não estamos debaixo da lei. O Novo Testamento estimula, sim, a moralidade. A maioria dos cristãos enfatiza a guarda dos mandamentos, de todos exceto o quarto. Isso parecia um pouco incoerente para mim. Mas, estudando mais, a resposta também veio clara. Em todas as partes do Novo Testamento que tratam de aplicação (a parte depois da cruz) há uma reafirmação de todos os deveres morais da lei dos Dez Mandamentos e também de algumas das outras leis do Velho Testamento. Mas essas reafirmações nunca apelam à lei como o motivo para observá-los, mas em cada oportunidade o apelo é a Cristo. Em 1Corintos 6.18-20, por exemplo, há uma clara admoestação à pureza sexual, mas Paulo não apela à lei como razão para manter a pureza sexual, mas ao fato de que somos templo de Deus e de que o Espírito de Cristo está em nós. Como poderíamos unir Jesus a uma prostituta?
O mesmo padrão é encontrado em todas as epístolas. Uma vez mais, precisei lembrar que essa seção das Escrituras foi especialmente escrita para aplicar a mensagem das Escrituras aos cristãos. Fiquei atônito ao descobrir que, no caso dos Dez Mandamentos, todos os mandamentos são reafirmados como importantes para o relacionamento dos cristãos com Cristo, exceto um: o sábado. O sábado nunca é ensinado como dever moral para os cristãos. Nem uma única vez! Ao invés disso, é reinterpretado como um descanso diário em Jesus, conforme já vimos. Observe o seguinte resumo dos mandamentos reafirmados no Novo Testamento:
1º | Adorar apenas a Deus | pelo menos 50 vezes |
2º | Não fazer ídolos | 12 vezes |
3º | Não profanar o nome de Deus | 4 vezes |
4º | Lembrar do sábado | não mencionado |
6º | Honrar os pais | 6 vezes |
5º | Não matar | 6 vezes |
7º | Não adulterar | 12 vezes |
8º | Não roubar | 4 vezes |
9º | Não mentir | 4 vezes |
10º | Não cobiçar | 9 vezes |
Se é verdade a posição adventista — de que o sábado será o derradeiro teste de todos os tempos, de que será o teste definitivo de lealdade, de que todos que são verdadeiros seguidores de Jesus estarão guardando o sábado e de que aqueles que deixarem de guardar receberão a “marca da besta” —, será que não seria de esperar que Deus incluísse repetidamente o sábado em sua lista de deveres morais para os cristãos ao longo do Novo Testamento? Será que Deus não advertiria repetidas vezes seus discípulos? Será que a quebra do sábado não estaria nas listas de pecados que tantas vezes Paulo e outros apresentaram e reapresentaram em suas advertências aos novos crentes? Por que não há nenhuma instrução aos gentios sobre a maneira de guardar o sábado? Será que no mundo gentílico não haveria algumas perguntas sobre como fazer isso? Em meus muitos anos como pastor adventista, uma das perguntas mais comuns que crentes novos e também membros de longa data me faziam era: “O que posso fazer e o que não posso fazer no sábado? Como podemos obedecer direito ao mandamento?” Não consigo entender que não houvesse absolutamente nenhuma instrução sobre esse assunto durante a era da igreja cristã. A razão é clara. Jesus é nosso sábado. Descansar nele a cada dia, indo até ele pela fé, é o sábado do Novo Testamento. Não há nenhuma outra explicação razoável, na minha opinião.7
Bem, e como fica a adoração no domingo? É certa, errada, ou não é importante? A compreensão a que cheguei com base em meu estudo é que não é uma questão importante. Não é nem certo nem errado. É sempre certo adorar a Deus junto com outros crentes o máximo de vezes possível. Em Atos 2.42-47 a igreja primitiva adorava todos os dias. Se fosse possível fazer isso, seria o ideal. Mas temos de cuidar de nossas vidas, e a adoração coletiva diária se torna inviável. Ainda assim, precisamos ter tempo para a adoração coletiva para completar nossa experiência diária. Não devemos negligenciar a adoração coletiva (Hebreus 10.25). Não é errado adorar no sábado nem é errado adorar no domingo, ou na quarta-feira ou em qualquer outro dia! Guardar um dia de descanso para reflexão e crescimento espiritual é saudável e deve ser incentivado. Mas a mensagem do Novo Testamento e do restante da Bíblia deixa claro que, para os cristãos, caso se escolha um dia para adoração, o dia da semana em que isso acontece não deve ser obrigatório nem imposto.
Foi interessante para mim descobrir como a igreja primitiva tratou disso. Em um estudo exaustivo sobre a questão da mudança do sábado para o domingo, D. A. Carson preparou um livro chamado From Sabbath to the Lord’s Day [Do shabbath para o dia do Senhor].8 Esse livro é uma obra bastante técnica que examina os pais da igreja primitiva e suas ideias sobre o sábado e o domingo. Desde o ano 100, os primeiros cristãos se reuniam unanimemente no domingo. Essa era uma prática universal entre os cristãos. Ninguém considerava que o domingo era um sábado de descanso. Mas todos se reuniam naquele dia. Isso aconteceu muito antes do que aquilo que os adventistas têm ensinado. Além disso, era algo unânime entre os discípulos dos apóstolos. É impensável que isso pudesse ter acontecido sem ter sido a prática geral durante a era apostólica. Além disso, quero dizer que os primeiros cristãos pensavam que esse era um dia bom para se reunir por causa da ressurreição, mas não o associavam a uma mudança do dia de descanso. Alguns desses cristãos, em sua maioria judeus, continuaram se encontrando no sábado. Outros, em sua maioria gentios, não continuaram. Eles tinham as razões já examinadas acima. Está claro que entendiam os ensinos de Paulo e do restante da Bíblia, conforme acabamos de estudar. O sábado era uma opção aceitável, mas não obrigatória para os cristãos. Mas havia uma necessidade de se reunir para a adoração. Porque muitos dos cristãos judeus ainda frequentavam a sinagoga no sábado, havia necessidade de ter outro momento em que os cristãos pudessem se reunir para suas próprias reuniões particulares. Isso passou a acontecer no domingo, que eles começaram a chamar de Dia do Senhor. Nosso primeiro registro disso é do ano de 107. Ou seja, apenas 11 anos depois de João mencionar o dia do Senhor em Apocalipse 1.10. É muito provável que João estava se referindo ao domingo, quando mencionou aquele dia. Não por causa de qualquer sacralidade ligada ao dia, mas porque era o dia comum de reunião dos cristãos.
Os primeiros cristãos tinham também uma ligação sentimental com o primeiro dia da semana. O Senhor não apenas ressuscitou nesse dia, mas, das sete aparições de Jesus a seus discípulos, cinco delas aconteceram no primeiro dia, e, quanto às outras aparições, não há menção específica sobre o dia em que ocorreram. Também naquele ano a festa de Pentecostes caiu no primeiro dia da semana. A igreja cristã nasceu num domingo. Mas isso não significa que os cristãos atribuíam àquele dia alguma sacralidade ou as características do dia de descanso. Eles não apelavam aos Dez Mandamentos para associar o dia de descanso ao domingo. Mesmo bem mais tarde, quando Constantino estabeleceu a primeira lei sobre o domingo, essa foi apenas uma lei que proibia o trabalho nesse dia. Ela foi bem recebida por igualmente cristãos e pagãos como uma pausa no trabalho. Essa lei tornou mais conveniente a adoração, mas não era de modo algum uma lei baseada no quarto mandamento. Aliás, aqueles que trabalhavam no campo estavam dispensados dessa lei. Eles podiam continuar seu trabalho. É claro que isso não era permitido na lei do Velho Testamento sobre o sábado.
Havia alguma atitude antijudaica naquela época. Alguns têm sugerido que, uma vez que os judeus enfrentavam problemas com o governo, os cristãos, para evitarem perseguição, tentaram se distanciar dos judeus, abandonando o sábado. Mas os registros dessa época não indicam um povo que fez alguma coisa para evitar ser perseguido por causa de Cristo. Os exemplos são de milhares de cristãos permanecerem firmes e corajosos em sua fé, apesar da ameaça de morte. Se a guarda do sábado tivesse sido convicção deles, eles teriam se posicionado claramente a favor do sábado. Mas eles não tinham essa convicção sobre o sábado, conforme claramente se vê naquilo que escreveram.
Foi apenas com Agostinho, no século quinto, que começou a se fazer alguma ligação entre os Dez Mandamentos e o domingo. Ainda assim a ligação não era rígida. O sábado como dia especial foi considerado cerimonial. Séculos mais tarde, Tomás de Aquino deu mais proeminência a essa ideia. Os reformadores Calvino e Lutero foram cuidadosos em declarar que o sábado não era mais obrigatório para os cristãos, mas eles viam mérito em separar um dia para descanso e adoração. Foi só na Reforma inglesa que começou a se insistir de fato no dia de descanso do Decálogo. Os principais proponentes foram os puritanos. Eles começaram a ensinar que o dia de descanso (que diziam que era o domingo) não foi abolido e, em conformidade com as normas do Velho Testamento, fizeram regras estritas a serem seguidas. Isso naturalmente afetou outros grupos ingleses, como os metodistas e os batistas. Muitos desses grupos que vieram para os Estados Unidos, mais especificamente para a região da Nova Inglaterra, se tornaram famosos pela estrita observância do dia de descanso (domingo). Foi ali que um grupo, os batistas do sétimo dia, deu um passo a mais e começou a guardar o sábado como o dia de descanso. Eles raciocinaram que, se o dia de descanso do Velho Testamento é obrigatório para os cristãos, devemos guardar também o dia certo. Foram os batistas do sétimo dia que influenciaram Joseph Bates, que por sua vez influenciou E. G. White, e assim nasceu o adventismo do sétimo dia. Os adventistas ainda estão basicamente debatendo com os “puritanos” qual dia é o verdadeiro dia de descanso, e não se essa foi ou não uma questão importante do Novo Testamento para os cristãos. Ao ficar debatendo qual é o dia de descanso, perdeu-se totalmente a mensagem das Escrituras e a mensagem que, com clareza, a igreja primitiva tinha em mente.
Continuei orando com toda sinceridade sobre essas coisas. Para a Paula e eu esse se tornou um assunto de muito autoexame e pesquisa contínua. O estudo todo me atingiu tão duramente que eu acordava no meio da noite e clamava a Deus: “Senhor, por favor não me deixe ser enganado. Eu quero ser seu fiel seguidor”. A cada vez, depois de muita oração e luta com Deus, as Escrituras vinham à minha mente com clareza ainda maior. Eu me apegava a Lucas 11.11-13 vez após vez, dia após dia. Jesus disse que, quando pedirmos o Espírito Santo, ele nos dará com certeza. Muitas vezes eu me afligi diante de Deus e orei para que ele tirasse minha vida, ao invés de me deixar ser enganado ou desonrar sua causa. Mas o Senhor continuou me dando segurança mediante suas promessas e sua Palavra. Gálatas 5.1 vinha à minha mente com grande clareza: “Para a liberdade foi que Cristo nos libertou. Permanecei, pois, firmes e não vos submetais, de novo, a jugo de escravidão”. Eu saía daqueles momentos renovado, cheio do Espírito de Deus e descansando em Jesus, meu sábado. As palavras da Bíblia ganharam vida para mim. Entendi aquelas partes da Bíblia que eu sempre tinha tido de minimizar. O véu tinha caído de meus olhos.
Enquanto isso, Paula estava, por ela mesma, chegando às mesmas conclusões. Nós sabíamos que Deus estava nos chamando a uma caminhada que era mais profunda com ele e poderia envolver abandonar tudo aquilo que era sinônimo de segurança para nós. Inicialmente havíamos pensado que talvez Deus quisesse que permanecêssemos na igreja e trabalhássemos por mudanças. Mas, à medida que orávamos mais e mais, nos sentíamos mais e mais desconfortáveis com essa opção. Nós dois somos uma equipe a quem Deus tinha especialmente dado o dom de alcançar pessoas sem igreja. Além disso, ele nos deu os dons de liderança e de ensino. Conhecer a verdade e simplesmente ficar sentados em cima dela esperando mudança não parecia se encaixar na maneira que Deus nos chamou. Mas estávamos dispostos a isso. Com certeza seria menos traumático. Para mim o outro lado da questão era minha responsabilidade de ensinar a verdade. Sou um ser humano falho, com muitas debilidades, mas Deus está fazendo uma grande obra em meu coração. Não posso viver uma vida dupla. Eu não sou um pregador eloquente nem tenho uma personalidade de chame a atenção. A única coisa que tenho a meu favor são minhas convicções e meu amor por Jesus. Se eu não puder falar do fundo do meu coração sobre minha experiência com Jesus, não sou nada.
Paula e eu também sentimos que seria errado continuar representando uma organização que não acreditamos mais que represente a verdade. Continuar servindo ali seria dar credibilidade às declarações da organização. Temos muitos amigos maravilhosos na igreja adventista. Somos gratos ao presidente de nossa conferência local e à nossa equipe de funcionários, aos anciãos, aos voluntários e a tantos outros que nos apoiaram e fizeram o máximo possível para nos ajudar a tentar construir uma igreja para uma nova geração. Não queremos feri-los nem ferir à igreja em Foster, pois os amamos muito e por quem dedicamos nossas vidas durante os últimos oito anos. Mas temos de seguir o Senhor nessa questão. Reconhecemos que haverá aqueles que discordarão fortemente de nosso entendimento das Escrituras e da percepção de nosso chamado. Mas nós não somos responsáveis perante eles. Somos responsáveis perante Deus.
Apesar das implicações destas descobertas serem assustadoras, há também um sentimento de enorme expectativa enquanto aguardamos o que Deus planejou para nós. Ele nos pede que vivamos no limite da fé. Temos de confiar nas promessas de Deus como nunca antes. Estamos verdadeiramente aprendendo a viver pela fé e a descansar em Jesus, nosso Senhor e nosso amigo. Para nós, isso não é mera teoria, mas uma experiência real de fé. É confiança na Palavra de Deus e dependência dele e apenas dele. Esse é descanso de sábado no dia a dia. Somos gratos porque Deus nos confiou sua verdade e nos permitiu que o puséssemos à prova. Apesar de nossos temores, estamos confiantes no futuro. Aonde Deus conduz, ele provê.
Clique aqui para acessar uma página com breves testemunhos de ex-adventistas.
Para refletir
- Você já notou pouca vitalidade em igrejas adventistas em comparação com algumas outras igrejas?
- Como você avalia os problemas de plágio nos livros de Ellen White?
- Dos textos bíblicos que levaram o pastor Greg a concluir que a guarda do sábado não é obrigatória, qual você acha o mais forte?
NOTAS |
---|
1. Samuele Bacchiocchi, Sabbath under crossfire (Berrien Springs: Biblical Perspectives, 1998), p. 245-248. 2. Ibid., p. 246-248. 3. Dale Ratzlaff, Sabbath in crisis (Glendale: Life Assurances Ministries, 1990) p. 310-311. 4. Ibid. Há, na verdade, três escolas de pensamento a respeito do sábado. Há um grupo pequeno, que inclui a IASD e ensina que o sábado continua no Novo Testamento. Um segundo grupo ensina a teologia da transferência e declara que o mandamento do sábado do sábado ainda é obrigatório, mas a sacralidade do dia foi transferida do sábado para o domingo. (Esse foi, na verdade, um desenvolvimento bem posterior na igreja cristã. Os primeiros cristãos não ensinavam nenhum dessas duas primeiras noções.) Há, por fim, um grupo maior de cristãos que ensinam que Jesus cumpriu o sábado e a lei. Ele é o nosso descanso sabático. 5. Essa é uma razão pela qual, na minha opinião, a doutrina adventista do Juízo Investigativo é tão precária. Ela se baseia em um único texto existente em uma passagem obscura da literatura apocalíptica. Ela é complicada pelo fato de que o contexto imediato parece estar falando não de uma questão celestial mas terrena. Ela é vinculada a outras passagens com laços gramaticais ainda mais tênues e ignora o vocabulário concreto — existente dentro do texto — da imagem de sacrifícios vespertinos e matutinos. A fim de conseguir que o poder do chifre se encaixe na interpretação adventista, é preciso fazer esse chifre crescer de um dos ventos, e não dos chifres do império grego, onde o chifre logicamente se encaixa. A conexão óbvia com Antíoco Epifânio é ignorada. Basear uma doutrina inteira de modo tão forçado é altamente suspeito. Fora do adventismo não há nenhum estudioso bíblico que concorde com a interpretação da IASD. Isso deve acender a luz de alerta, pois o adventismo faz demasiadas afirmações dogmáticas. Em essência, a posição da IASD tem o respaldo de um único e fraco texto e de E. G. White. Para mim, isso não se parece com a ideia de seguir “a Bíblia e só a Bíblia”. 6. Veja 2Coríntios 3.6-9 e Hebreus 8.13. 7. Determinar como exatamente guardar o sábado tem sido um problema para muitos sabatistas. Anos atrás muitos internatos adventistas não permitiam que os alunos tomassem banho no sábado. Eu cresci com certas regras não escritas acerca da observância do sábado. Era aceitável caminhar na água no sábado, mas nadar não era. Era aceitável andar de bicicletas, mas não se elas tivessem motor. Era aceitável participar de jogos desde que a palavra “Bíblia” fosse parte do nome do jogo. Para nós a distância de um dia de sábado era a distância que alguém conseguia viajar com um tanque de gasolina, sem reabastecer no dia santo. Era possível comer na lanchonete das reuniões campais desde que o lanche tivesse sido pago no dia anterior. O problema é claro. Se a lei do Velho Testamento ainda é obrigatória, então que direito temos de deixar que as pessoas carreguem pesos, ou viajem, ou preparem refeições, ou criem todas essas subregras? Será que é de alguma forma diferente daquilo que os rabis faziam com suas mais de 600 regras sobre o sábado? Por outro lado, se o Novo Testamento reinterpretou essas coisas em Cristo, por que não levamos às últimas conclusões o que está escrito ali e não paramos de vez de tornar o sábado um ponto crucial? Acaso não devemos nos concentrar em Jesus, que é nosso verdadeiro sábado? Do contrário, será que não somos culpados de um neolegalismo com apenas outra série de regras que nós criamos? O silêncio do Novo Testamento sobre a questão de como guardar o sábado é uma poderosa declaração de que Deus não pretendia que seus seguidores seguissem esse caminho (veja Gálatas 5.1). 8. D. A. Carson, organizador, From Sabbath to the Lord’s Day: a biblical, historical, and theological investigation [edição em português: Do shabbath para o dia do Senhor, tradução de Susana Klassen (São Paulo: Cultura Cristã, 2006)]. |